A lida com o luto dos tutores de animais de estimação é uma experiência profunda e faz parte da rotina de médicos-veterinários, o que provoca impactos na saúde psicoemocional das equipes. Para que as experiências não sejam traumáticas nem para os profissionais, nem para os clientes, algumas medidas são fundamentais e têm reflexos que vão além da saúde mental.
É o que comenta o médico-veterinário Paulo Corte Neto, integrante da Comissão de Entidades Veterinárias Regionais e da Comissão Técnica de Clínicos de Pequenos Animais do Conselho Regional de Medicina Veterinária do Estado de São Paulo (CRMV-SP). “Estudar e adotar condutas é tão importante para lidar com o luto quanto é para as áreas técnica e sanitária.”
De acordo com Neto, deve haver um protocolo a ser seguido por todos, desde os cirurgiões até os colaboradores da limpeza e da recepção, para um atendimento específico e com a comunicação correta. “O trabalho humanizado, pautado na transparência e na empatia, gera acolhimento mútuo entre profissionais e tutores, o que atenua desgastes emocionais.”
Nesse sentido, o médico-veterinário frisa que não apenas o cliente é beneficiado, mas os próprios profissionais atuam de forma a construir um ambiente salutar para que o luto não seja sempre uma experiência traumática para as equipes.
Valorização profissional
No aspecto profissional, essa abordagem valoriza o médico-veterinário, o que é possível notar no depoimento da juíza de paz Lorilene Severino, que passou pelo luto com a cadelinha Pepita, poodle de 16 anos, que teve câncer e outras complicações. Foram dois anos em tratamento, com a necessidade de socorrê-la de madrugada diversas vezes, entre outras situações.
“Fiquei exausta e abalada. Se não fosse o apoio da equipe veterinária, tudo teria sido pior. Sou muito grata aos profissionais que participaram da minha história com a Pepita”, conta Lorilene, que, anos antes, passou pela perda de outro cão, mas com uma experiência fria no atendimento. “No caso da Pepita, fui abraçada e me senti respeitada e acolhida.”
Sem humanização, seu negócio também é afetado
Lorilene diz que sente total confiança na equipe que cuidou da Pepita e deixou de ir a outras clínicas. “Isso vai na direção do que aponta uma pesquisa recente, nos EUA, que identificou que algo em torno de 80% dos tutores não retornam com outros animais aos locais em que seus pets morreram”, comenta Neto, enfatizando o impacto na reputação e nos negócios.
“Qual a imagem que você quer deixar na memória do tutor sobre o seu trabalho?”, indaga o médico-veterinário sobre este momento que marca a vida de famílias inteiras. Nesse sentido, é importante refletir que o respeito com a história das pessoas com seus animais requer todo o cuidado e isso não exige investimento financeiro, mas dedicação e profissionalismo.
Perceba os sinais do luto e contorne a situação
A psicóloga Joelma Ruiz explica que o luto é uma transição psicossocial e que pode ter início antes da morte, no processo de adoecimento. Ela comenta que, embora o luto seja “individual e singular, ou seja, cada um reage de uma forma”, é possível identificar comportamentos comuns aos enlutados, que sofrem com a perda de pets tão amados.
“Entre essas manifestações estão: tristeza; culpa; raiva e hostilidade; déficit de memória e pensamentos obsessivos”, afirma Joelma. Portanto, é preciso preparo das equipes para lidar com tais comportamentos, que são absolutamente naturais no processo do luto.
Confira medidas que podem fazer toda a diferença para a saúde mental da sua equipe e para a reputação do seu estabelecimento médico-veterinário:
Condutas:
– Atualize-se sobre o luto, assim como você se atualiza na área técnica;
– Sempre seja claro quanto ao quadro do animal e sobre sua dedicação em fazer todo o possível para salvá-lo;
– Discuta casos graves com a equipe. Em caso de morte, isso ajuda para que o profissional não carregue sentimento de culpa pela perda do paciente;
– Alinhe a abordagem calma e amorosa com todos da equipe (isso inclui recepcionista e auxiliar de limpeza também);
– Flexibilize horários de visita para casos mais graves;
– Se tiver que dar a notícia do óbito ou de que ele está por vir, separe mais tempo na agenda. Isso não pode ser feito às pressas.
Espaço:
– Procure ter um espaço separado para atender tutores enlutados. Não é bom que eles fiquem na mesma recepção que os que estão levando um filhote para vacinar, por exemplo;
– Também é indicado ter uma sala destinada para a despedida. Não faça isso no consultório, para que não fique essa lembrança final do local;
– Em vez de plásticos pretos para acomodar o corpo do animal, prefira os brancos, para evitar impressionar o tutor caso ele tenha que ter acesso;
– Tenha uma logística de preparo do animal para a despedida final (se ele estiver sujo, inclusive, deve ser limpo e não estar com odor ruim);
– Detalhes fazem a diferença! Por isso, procure negociar com um fornecedor de flores para um vasinho à família;
– Preparar um texto, como uma carta da equipe, parabenizando pela força, ou um poema com uma mensagem positiva para entregar ao tutor na saída.