É senso comum que a migração de animais, como as viagens humanas ao redor do mundo, pode transportar patógenos por longas distâncias, em alguns casos, aumentando os riscos de doenças aos seres humanos.
Mas em artigo recém-publicado na revista Science, os pesquisadores da Faculdade de Ecologia Odum, da Universidade da Geórgia, disseram que, em alguns casos, as migrações dos animais podem realmente ajudar a reduzir a disseminação e a prevalência de doenças, e até promover a evolução de cepas menos virulentas.
Todo ano, milhares de animais migram. Alguns levam meses para viajar milhares de quilômetros ao redor do mundo. Ao longo do caminho, eles podem encontrar uma ampla gama de patógenos ao utilizar diferentes habitats e recursos. Pontos de parada onde os animais descansam e se reabastecem muitas vezes são compartilhados por várias espécies em grandes comunidades, permitindo que as doenças se espalhem entre elas.
Mas, de acordo com a professora Sonia Altizer e suas coautoras, as estudantes de pós-doutorado Rebecca Bartel e Barbara Han, a migração também pode ajudar a limitar a propagação de determinados patógenos.
Alguns tipos de parasitas têm estágios de transmissão que podem se acumular no ambiente onde vivem animais hospedeiros, e a migração permite que eles escapem periodicamente dos habitats carregados de parasitas. Após a partida, o número de parasitas se torna bastante reduzido, de modo que, quando os animais retornam, encontram um lugar praticamente livre de doenças.
“Ao colocar a enfermidade em um contexto ecológico, você não só vê padrões contra-intuitivos, mas também compreende as vantagens das transmissão. Esse é um exemplo clássico do melhor lado da ecologia das doenças”, afirma o reitor da Odum, John Gittleman.
O desmatamento, a urbanização e a expansão da agricultura, porém, têm eliminado muitos locais de parada dos animais, e barreiras artificiais, como represas e cercas, bloqueiam as rotas de migração de diversas espécies. Essas mudanças podem elevar artificialmente a densidade populacional dos animais e facilitar o contato entre animais selvagens e humanos, aumentando o risco de que agentes patogênicos se espalhem entre as espécies.
“Vários animais migratórios são injustamente acusados de disseminar infecções aos seres humanos, pois existem muitos exemplos que sugerem o contrário, que os humanos são responsáveis pela criação de condições que aumentam as doenças em espécies migratórias”, observou Barbara.
Com recursos alimentares disponíveis o ano todo, algumas espécies podem reduzir ou até abandonar totalmente as migrações e prolongar sua exposição aos parasitas no ambiente, elevando as taxas de infecção e favorecendo o desenvolvimento de cepas mais virulentas. “A migração é uma estratégia que tem evoluído ao longo de milhões de anos em resposta às pressões de seleção conduzidas por recursos naturais, predadores e infecções letais. Alterações dessa estratégia poderiam traduzir-se em mudanças na dinâmica das doenças”, acrescentou Barbara.
“Há uma necessidade urgente de novos estudos sobre a dinâmica dos patógenos em espécies migratórias e como as atividades humanas a afetam”, disse Sonia. O artigo conclui com um resumo dos desafios e questões para futuras pesquisas. “Precisamos aprender mais para tomar decisões sobre a conservação e a gestão dos animais selvagens, e prever e mitigar os efeitos de futuros surtos de doenças infecciosas”, completou.
Fonte: O Estado de São Paulo (acessado em 21/01/11)