MP diz que incêndio no Butantan foi criminoso e aponta responsáveis

O Ministério Público de São Paulo informou nesta quinta-feira (30) que o incêndio que destruiu o maior acervo de cobras, aranhas e escorpiões para pesquisa do mundo no laboratório de répteis do Instituto Butantan, ocorrido em 15 de maio de 2010, foi criminoso.

De acordo com a promotora Eliana Passarelli, cinco pessoas, entre diretores, pesquisador e engenheiro do instituto, serão responsabilizadas pelo crime de incêndio culposo, quando não há intenção de provocá-lo, mas assume o risco de causá-lo. “O incêndio foi criminoso e essas cinco pessoas foram imperitas e negligentes”, afirmou a promotora.

De acordo com a Promotoria, eles assumiram o risco ao não tomar as medidas de segurança necessárias e colocar matérias inflamáveis perto de fontes de energia elétrica em número acima das permitidas para o local.

Segundo a promotora, a reforma no prédio também não teve alvará. Segundo ela, 17 animais morreram no incêndio, sendo 15 cobras e dois sapos. Além disso, o fogo destruiu 85 mil peças da coleção. Os exemplares estavam empalhados e conservados em vidros com formol. O acervo havia sido iniciado 120 anos atrás.

Eliana Passarelli disse que se baseou no laudo do Instituto de Criminalística (IC) da Polícia Técnico Científica de São Paulo, concluído em março deste ano, para chegar a essa conclusão.
Por meio de nota, a assessoria de imprensa do Instituto Butantan informou que “ainda não recebeu o relatório do Ministério Público” sobre o incêndio, mas se colocou à disposição “para quaisquer esclarecimentos”.

“A instituição esclarece que vem tomando todas as medidas de segurança necessárias ao combate a incêndios. Os prédios da instituição possuem extintores, além de brigadistas treinados para combate a incêndios, atendimentos de primeiros socorros e utilização de equipamentos específicos. O Instituto vem implantando a brigada conforme indicado pelo Corpo de Bombeiros”, afirmou, no comunicado.

O G1 entrou em contato ainda com a assessoria de imprensa da Prefeitura de São Paulo para comentar o assunto, mas esta não se manifestou até as 18h45 desta quinta-feira.

O laudo feito pelo Núcleo de Engenharia do IC concluiu que o incêndio começou após o superaquecimento de uma pedra com resistência elétrica utilizada para esquentar o terrário (ambiente climatizado destinado aos animais). O objeto estava sobre uma mesa de madeira em cima do mezanino da curadoria. Papelão também cobria essa pedra.

O perito afirmou no laudo que, “não sendo possível precisar a causa”, a “mais aceitável” é que ocorreu “dissipação de calor gerado pelo terrário”. Em sua conclusão, o perito eliminou a hipótese de curto-circuito. “O incêndio em questão teve início na sala do curador, e princípio no terrário. Admite-se que houve um superaquecimento na pedra quente do terrário, o que teria dado início ao incêndio. O calor gerado em contato com materiais de fácil combustão [principalmente madeira e papel] proporcionou a rápida evolução e propagação das chamas, vindo atingir o depósito de animais onde se encontravam os milhares de litros de álcool”.

No prédio havia mais de 200 mil litros de álcool armazenados num depósito. Mesmo sem apontar uma causa direta do que gerou o superaquecimento na pedra, o perito citou algumas evidências técnicas no seu trabalho que podem sugerir uma possível relação delas com o incêndio. O primeiro é que a resistência da pedra que deu origem ao incêndio tinha “potência acima do usual” e o outro é que essa mesma pedra estava coberta por um pedaço de “papelão”.

Além disso, o modelo usado para aquecer a pedra no terrário tinha 50 watts de potência enquanto o recomendado era os que tinham frequências de 3 watts a 17 watts. Segundo o perito, o “catalisador”, substância que diminui a energia, “não estava bem distribuída na massa da pedra”.

Para a promotora, o laudo informa que o equipamento falhou porque foi usado de modo inadequado por quem o instalou. O documento sugere que esse calor propagado pela pedra entrou em contato com o papelão que estava sobre ela. O perito informou que o procedimento de cobrir a pedra com um material inflamável não deve ser feito.

Ele disse no laudo que a pedra “não deve estar envolta ou coberta por nenhum material, principalmente papelões que são bons isolantes térmicos e, geralmente, usados para piso dos animais e facilitar a limpeza, porém, são inflamáveis”.

Além disso, o mezanino foi construído sem qualquer norma técnica e a reforma do mesmo foi realizada sem alvará. “Não teve acompanhamento de engenheiro. A Prefeitura ficou aleatória a tudo isso. No mezanino, estavam 17 animais que morreram queimados. Ali, não era para ter colocado esses bichos. Outra irregularidade é que ali tinha um aparelho com resistência maior do que a permitida e papelão”, disse.

A promotora, no entanto, não irá denunciar os supostos autores à Justiça pelo crime, porque ele é de menor potencial ofensivo. Numa eventual condenação, a pena máxima é de dois anos, podendo ser revertida para pagamento de cestas básicas para entidades assistenciais ou prestação de serviços à comunidade.

Em vez disso, ela disse que irá oferecer um acordo em troca da suspensão da ação penal contra eles. Será proposta uma transação penal, baseada no benefício da lei 9.099/95, que busca encontrar uma alternativa para pessoas que nunca tiveram passagem pela polícia antes.

Os suspeitos também poderão pagar cestas básicas para entidades assistenciais ou prestarem serviços à comunidade, mas a diferença é que, na transação penal, isso ocorre mais rápido do que em um processo penal.

“Vou pedir que os cinco façam algum trabalho para a comunidade”, disse Eliana Passarelli. Segundo ela, essa proposta de acordo foi entregue na quarta-feira (29) ao Poder Judiciário. A transação penal só poderá ocorrer se a juíza Angélica Aparecida Correa e as partes citadas como autores do incêndio aceitarem o acordo.

Se isso ocorrer, não haverá denúncia do Ministério Público ou condenados pela Justiça. Os suspeitos não poderão ser considerados culpados. “Mas serão sempre apontados como autores do incêndio”, disse a promotora, que pode voltar atrás da sua decisão e oferecer a denúncia contra os cinco envolvidos no caso da recusa do acordo.

Eliana Passarelli também afirmou que vai encaminhar uma cópia do documento no qual ela aponta a autoria dos cinco integrantes do Instituto Butantan para a Corregedoria Geral do Estado de São Paulo. “Lá, o órgão deverá avaliar se vai tomar providências do ponto de vista administrativo contra os envolvidos”, disse a promotora. O Instituto Butantan é ligado à Secretaria Estadual de Saúde.

O mesmo laudo que foi usado pelo Ministério Público para informar que houve incêndio criminoso no Butantan foi usado pela Polícia Civil para dizer que o que ocorreu foi uma fatalidade. Em 23 de março, o G1 publicou matéria na qual o delegado Guaracy Moreira Filho, titular do 51º Distrito Policial, no Butantã, dizia que o inquérito que apurou as causas e eventuais responsabilidades no caso do incêndio foi concluído sem apontar culpados.

O policial havia dito que não havia elementos no laudo sobre as prováveis causas do fogo e nos depoimentos das testemunhas que indiquem a responsabilidade de alguém. No entendimento do delegado que investigou o caso, foi possível afirmar que o incêndio foi acidental.

“A polícia vai concluir que foi erro culposo e não crime culposo. Houve erro de melhor entendimento do sistema de lidar com cobras naquele ambiente com muito álcool. Faltou certo cuidado. Foi mais um acidente. Pelo laudo e depoimentos não há elementos suficientes a ponto de justificar o indiciamento de alguém pelo incêndio”, disse o delegado, na ocasião.

Fonte: G1 (acessado em 01/07/2011)

Relacionadas

Imagem de freepik
Imagem de mulher sorridente segurando telefone ao lado dos dizeres: Semana do Zootecnista. Inscreva-se.
homem careca de cavanhaque usando jaleco branco e escrevendo em uma pasta, dentro de um curral.
mão colocando envelope rosa dentro de uma urna de votação de papelão.

Mais Lidas

Diagnóstico por imagem é uma das especialidades reconhecidas pelo CFMV
Crédito: Acervo CRMV-SP
Notebook com a tela inicial da Solução Integrada de Gestão do CRMV-SP (SIG CRMV-SP)
Responsável técnico é a figura central que responde ética, legal e tecnicamente pelos atos profissionais da empresa
Crédito: Freepik
Em São Paulo, a primeira instituição destinada ao ensino da Veterinária teve origem no Instituto de Veterinária, nas dependências do Instituto Butantan, no ano de 1919 Crédito da foto: Acervo Histórico/FMVZ-USP

Contato

(11) 5908 4799

Sede CRMV-SP 

Endereço: Rua Apeninos, 1.088 – Paraíso – CEP: 04104-021
Cidade: São Paulo

Newsletter

Todos os direitos reservados ao Conselho Regional de Medicina Veterinária do Estado de São Paulo – CNPJ: 50.052.885/0001-40