Boas notícias emergiram ontem das cinzas do Prédio das Coleções do Instituto Butantã. Muitos dos espécimes mais importantes do acervo de cobras – os chamados “holótipos” ou “tipos” -, que estavam dentro de um armário fechado, escaparam quase ilesos do fogo. Parte da coleção de aranhas também foi salva dos escombros, mas não se sabe quanto exatamente.
O Estado acompanhou com exclusividade o momento em que alunos entraram no armário onde ficavam os holótipos e descobriram que parte do material não havia sido queimado. “Holótipo de alcatraz!”, gritou um biólogo lá de dentro, eufórico. “Insularis também!”, completou ele, alguns minutos depois, para alegria de pesquisadores e colegas que aguardavam ansiosos do lado de fora.
Os nomes se referem aos primeiros exemplares descritos das espécies Bothrops alcatraz e Bothrops insularis, popularmente chamadas jarara-de-alcatrazes e jararaca-ilhôa, raríssimas, que só existem em duas ilhas do litoral paulista. Pelas estimativas do pesquisador Marcelo Duarte, cerca de 70% do material tipo pode ter sido salvo e ainda há vidros inteiros na parte mais funda do armário, que os alunos não alcançaram.
O resgate só foi possível graças a um novo princípio de incêndio. A veterinária Cristina España, que faz trabalho de doutorado sobre dentição de cobras no Butantan, notou fumaça saindo pelo telhado do prédio, no início da tarde. Chamou os bombeiros, que chegaram em menos de dez minutos e verificaram que havia um arquivo de papéis em chamas. Nada grave.
Com a presença dos bombeiros, os cientistas aproveitaram para entrar no prédio, que estava interditado por risco de desabamento, e iniciar a busca por “sobreviventes” em meio às cinzas, escombros e ferros retorcidos. De repente, começou um corre-corre, com alunos saindo do prédio cheios de cobras chamuscadas e potes de vidro semiderretidos nos braços. “Muito bom. Desse jeito ainda dá para aproveitar”, comemorava o pesquisador Otavio Marques.
O material tipo, especificamente, estava na ponta de um armário compactador, comprado recentemente (do tipo que escorrega em trilhos, para poupar espaço). O miolo da fileira de armários foi totalmente incinerado, mas a ponta onde estavam os holótipos, por sorte, não. Apesar dos vidros quebrados e das tampas derretidas por causa do calor, muitos dos bichos embebidos em álcool não pegaram fogo.
O trabalho teve de ser interrompido após cerca de meia hora porque os bombeiros notaram que a estrutura do prédio estava cedendo e havia risco de o telhado desabar. O material resgatado passará por uma triagem para identificação e reorganização da coleção.
Outra boa notícia é que os “livros de tombo” originais da coleção não estavam no prédio incinerado. Eles contêm os registros por escrito de todos os espécimes “tombados” (depositados) na coleção. Ainda que os bichos tenham sido perdidos, pelo menos as informações referentes a eles poderão ser resgatadas. Os arquivos digitais do acervo também não foram afetados, segundo o zoólogo Francisco Luis Franco, curador da coleção.
Fonte: Estadão (acessado em 18/05/10)