SÉRIE ZOONOSES: LEPTOSPIROSE

O que é leptospirose?

A leptospirose é uma enfermidade causada por bactérias do gênero Leptospira, que possuem cerca de 250 variedades sorológicas. A doença pode ocorrer em animais domésticos, silvestres e em seres humanos. Provavelmente é uma das zoonoses de maior distribuição geográfica, evidenciada em mais da metade dos países, endêmica na América Latina e no Caribe, com impacto na saúde pública e na economia agropecuária. No Brasil, a leptospirose humana é registrada em todas as unidades da federação. Segundo estimativa da Fundação Nacional de Saúde, a Funasa (http://www.funasa.gov.br), anualmente são registrados cerca de 10 mil casos de leptospirose com surtos epidêmicos na época das chuvas. A ocorrência da leptospirose está ligada às condições ambientais, pois as leptospiras necessitam de umidade para se manter vivas. Em água limpa, por exemplo, sobrevivem por até 152 dias, mas não toleram alta salinidade, dessecação, acidez e meio ambiente muito contaminado. Sem dúvida, a água das chuvas é ideal para a sua sobrevivência.

Como acontece a transmissão da leptospirose nas cidades?

A leptospirose ocorre nos centros urbanos e no campo. Nas cidades, pode atingir o homem e os animais domésticos dentro de casa, pelo contato com roedores, como ratazanas, ratos de telhado e camundongos, animais que buscam restos de alimento no lixo e esgoto. Os roedores não apresentam sinais clínicos, mas são os principais transmissores da leptospirose por excretarem a bactéria em grande quantidade pela urina praticamente por toda vida. As leptospiras penetram na pele pelos olhos, boca, nariz e genital dos seres humanos e animais, por meio do contato com ambiente contaminado com urina de roedores ou pela lida com as excretas de outros animais doentes. Muitas vezes, o cão é o primeiro a adoecer e transmitir a enfermidade aos tutores. No período das chuvas, quando ocorrem enchentes, os surtos de leptospirose humana tornam-se frequentes, principalmente nos locais de más condições de saneamento básico, com esgoto a céu aberto e lixões. Ao entrar em contato com as águas contaminadas pela inundação das tocas repletas de urina de roedores, o homem e os animais domésticos são acometidos pela doença. Infelizmente, o risco não desaparece depois que a águabaixa, pois a bactéria continua ativa na lama e nos resíduos úmidos.

Como acontece a transmissão da leptospirose na área rural?

Na zona rural, as características do ambiente e a presença de roedores e animais silvestres assumem grande importância na transmissão da leptospirose para as espécies produtivas, como bovinos, bubalinos, ovinos, caprinos, eqüinos e suínos. Nestes animais, as leptospiras, além da urina, estão presentes nas carcaças, nos fetos que são abortados por conta da doença, na placenta, nas descargas cérvico-vaginais e no sêmen de reprodutores, que transmitem a enfermidade diretamente para as fêmeas durante a cópula. Uma vez presentes nas margens de rios, riachos, aguadas, tanques, bebedouros, alimentos, rações e utensílios, as leptospiras se mantêm, disseminando a doença. Ainda nas propriedades rurais, a infecção humana ocorre pelo contato com o meio ambiente contaminado e na lida com o rebanho doente. A presença de cães junto aos rebanhos pode fechar o ciclo de transmissão, tanto para o homem, quanto para o próprio rebanho. Isso acontece porque os cães têm acesso às excretas de animais doentes e porque se alimentam com restos placentários e fetais, ricos em leptospiras. Alguns animais podem se recuperar da infecção, mas continuam eliminando leptospiras pela urina por anos ou até a vida toda. Sendo assim, eles se mantêm como fontes de infecção constante para o ambiente, o rebanho, os animais domésticos e o homem.

Quem sofre o maior risco de contrair leptospirose?

Algumas profissões estão particularmente expostas pelo tipo de trabalho. São eles os profissionais que trabalham em esgotos, coletores de lixo, mineiros, bombeiros, agricultores de plantação de cana-de-açúcar e arrozais, granjeiros, magarefes de abatedouros, tratadores de animais de produção e de canis, e médicos veterinários. Estes últimos constituem o principal grupo de risco ocupacional no mundo, principalmente na lida com rebanhos bovinos leiteiros e granjas produtoras de suínos. Há ainda a possibilidade do homem se infectar em atividades recreativas e de lazer, embora essa condição seja acidental. Isso acontece, por exemplo, ao tomar banho em rios, riachos, lagos ou mananciais que recebem dejetos de animais; na prática de atividades esportivas em ambientes contaminados, como em pescarias; ou na prática de esportes radicais em áreas onde habitam animais silvestres e roedores.

Quais são os sintomas da leptospirose nos animais domésticos?

As manifestações clínicas na leptospirose variam com a espécie e o tipo de leptospira infectante. Nos cães, há diversos sinais clínicos, dependendo da variedade sorológica. Os mais frequentes nos grandes centros urbanos são Copenhageni e Canicola. Na forma aguda, o cão pode apresentar febre, letargia, depressão, falta de apetite, vômito, diarréia, urinar frequente, sede intensa, halitose, úlceras bucais, dor abdominal ou lombar, dores musculares, icterícia (amarelão), pequenos sangramentos e hemorragias. A conseqüência mais grave da doença é a morte por insuficiência renal e hepática. A bactéria se multiplica ativamente nos órgãos, sangue, linfa e líquor, atingindo os vasos sanguíneos e originando vasculite generalizada. A bactéria persiste, se multiplica nos rins e é eliminada pela urina. Entretanto, a bactéria não é eliminada de uma vez, há jatos de urina com leptospira e outros sem. Isso começa a acontecer após 72 horas da infecção e pode continuar por meses.

E nos animais de produção? Quais são os principais sintomas da leptospirose?

Nas espécies de animais de produção, a leptospirose provoca infertilidade e abortamento, o que reduzo nascimento de animais e, portanto, diminui produção de leite e carne, causando enormes prejuízos aos rebanhos. Nos equinos, além do impacto na a reprodução, a doença pode dar origem a doenças oculares, que evoluem para a cegueira. O homem que lida diretamente com as criações se infecta pelo o contato com animais doentes ou portadores assintomáticos que excretam a bactéria pela urina.

Quais são os sintomas da leptospirose nas pessoas?

A leptospirose humana pode se manifestar de forma leve, moderada ou severa e fatal, como ictérica (amarelão). O aparecimento dos sintomas acontece de dois a 30 dias após o contato com a bactéria. Inicialmente, a leptospirose se assemelha à gripe, febre amarela, dengue, malária, hantavirose e hepatites. Os sintomas vão de febre alta repentina, mal-estar, dores musculares especialmente na panturrilha, dor de cabeça e no tórax, olhos vermelhos, tosse, cansaço, calafrios, náuseas, diarréia e desidratação, até sangramentos no nariz, gengiva, hemorragia dos pulmões, comprometimento dos rins, coração e meninges. Estes últimos são sinais da forma grave, que leva à morte em 10% dos casos. Alguns sintomas cedem nos quatro primeiros dias, reaparecendo posteriormente com o agravamento do quadro clínico. Os homens com idade entre 20 e 49 anos, são os mais atingidos, devido à maior exposição no trabalho ou no ambiente, mas não há uma predisposição de gênero ou de idade para se infectar.

Como é feito o diagnóstico da leptospirose?

O diagnóstico da leptospirose não é fácil, pois necessita de informações claras de exposição e de avaliação minuciosa dos sinais clínicos realizada pelo médico ou médico–veterinário, já que existem outras doenças com manifestações semelhantes no homem e nos animais. É preciso realizar exames laboratoriais que confirmem a hipótese de leptospirose levantada durante o exame clínico. O exame mais utilizado, tanto em animais quanto em humanos, é o de reação de soroaglutinação microscópica, que analisa amostras de sangue. É um procedimento rápido e de baixo custo, com alta sensibilidade e especificidade. Em cães, devem ser colhidas duas amostras com intervalo de sete a 21 dias. Entretanto, o resultado negativo na fase inicial não exclui doença, já que os anticorpos começam a ser produzidos a partir da segunda semana de infecção. É importante analisar novas amostras, colhidas com intervalos de 20 a 30 dias, para estabelecer o diagnóstico nos rebanhos de animais de produção.

Como é feito o diagnóstico em seres humanos?

Diante dos primeiros sintomas, a pessoa deve procurar um médico e informar que teve contato com águas de enchentes, animais de companhia ou de produção. A partir destas informações, junto com o quadro clínico e os exames laboratoriais, é que são reunidos os elementos que orientam a definição do diagnóstico.

Em humanos, assim como acontece com os cães, devem ser colhidas duas amostras de sangue com intervalo de sete a 21 dias. Porém, o resultado negativo não exclui doença, já que os anticorpos começam a ser produzidos a partir da 2ª semana.

O diagnóstico humano conta com o serviço do Ambulatório de Zoonoses do Instituto de Infectologia Emílio Ribas, na capital paulista. Os interessados podem se dirigir à Avenida Dr. Arnaldo, 165- Prédio dos Ambulatórios. Também é possível entrar em contato pelo telefone (11) 3896-1200. As consultas podem ser agendadas por telefone ou pelo site http://migre.me/te0Lu. Quem coordena os trabalhos é o Dr. Marcos Vinicius da Silva (marcos.silva@emilioribas.sp.gov.br ou mvsilva@pucsp.br).

Como é feito o tratamento da leptospirose em seres humanos?

Quanto antes começar o tratamento da leptospirose, menor será a chance de quadros graves. Há estudos que mostram a diminuição da mortalidade humana quando são aplicados antibióticos durante os primeiros dias de infecção e também em pacientes em estado avançado da doença, junto com medidas para melhorar as funções hepática e renal. É importante lembrar que a automedicação pode mascarar os sintomas. No Brasil, não há vacinas humanas registradas.

Como é feito o tratamento da leptospirose em animais?

Nos cães, o tratamento se faz da mesma forma que em humanos, porém, existem vacinas preventivas contra a leptospirose canina. Nos animais de produção, diante de focos ou preventivamente, é utilizada a terapia com antibióticos e a vacinação preventiva de rebanhos. As vacinas são produzidas especificamente para a variedade da bactéria que atinge com mais freqüência uma determinada espécie animal em determinada região, portanto não protegem contra a infecção por outras variedade. O animal exposto à infecção e não tratado pode se tornar portador renal, mesmo que vacinado, e se constitui em excretor da leptospira pela urina e disseminador da doença. O Instituto Biológico é referência no diagnóstico da leptospirose em animais de produção. Para mais informações, consulte o site http://www.biologico.sp.gov.br.

Como evitar a leptospirose?

Converse com o seu médico-veterinário. Ele é fundamental para e as medidas preventivas aos tutores de animais domésticos e criadores em canis. Além disso, estes são os profissionais que atuam como responsáveis técnicos e zelam pela sanidade dos rebanhos.

Medidas básicas de saneamento, higiene domiciliar, destinação correta de excretas, descarte adequado de restos de alimentos e da água devem ser tomadas. A anti-ratização e desratização devem ser utilizadas sempre que necessárias onde houver criação de animais domésticos ou de produção.
Na área rural, é preciso ficar atento às condições do meio ambiente e ao acesso de roedores, animais silvestres e cães às instalações, à ração e à água dos animais de produção. Também são essenciais a vacinação preventiva e a destinação adequada de lixo, excretas e carcaças, juntamente com gestão sanitária correta.

O uso de luvas, botas de borracha e outros equipamentos de proteção individual não deve ser esquecido na lida com animais de produção, no trabalho de limpeza do ambiente domiciliar ou em criatórios.

Relacionadas

Primeira_reuniao_Plenaria_nova_gestao_CRMV-SP_CFMV_15.05 (1)_ed
Cerimonia_posse_oficial_14.08 (25)_ed
09.05.2024_FEBRE_OROPOUCHE_Adobe_Stock_MATÉRIA
12.08.2024_FeiraPetVet_Freepik

Mais Lidas

Diagnóstico por imagem é uma das especialidades reconhecidas pelo CFMV
Crédito: Acervo CRMV-SP
Notebook com a tela inicial da Solução Integrada de Gestão do CRMV-SP (SIG CRMV-SP)
Responsável técnico é a figura central que responde ética, legal e tecnicamente pelos atos profissionais da empresa
Crédito: Freepik
Em São Paulo, a primeira instituição destinada ao ensino da Veterinária teve origem no Instituto de Veterinária, nas dependências do Instituto Butantan, no ano de 1919 Crédito da foto: Acervo Histórico/FMVZ-USP

Contato

(11) 5908 4799

Sede CRMV-SP 

Endereço: Rua Apeninos, 1.088 – Paraíso – CEP: 04104-021
Cidade: São Paulo

Newsletter

Todos os direitos reservados ao Conselho Regional de Medicina Veterinária do Estado de São Paulo – CNPJ: 50.052.885/0001-40