Um pesquisa da Unicamp identificou grupos de bactérias envolvidos no estufamento das carnes embaladas a vácuo, o que pode ser considerado primeiro sinal de deterioração do produto. O trabalho é de autoria do biólogo Rafael Djalma Chaves e foi apresentado na Faculdade de Engenharia de Alimentos da universidade. De acordo com a professora e orientadora da pesquisa, Pilar Rodriguez de Massaguer, o estufamento é apenas um dos defeitos que podem ocorrer nas embalagens a vácuo e não existiam estudos realizados anteriormente que relacionassem esses grupos de bactérias à contaminação.
O estufamento pode ser considerado o início da deterioração, porém há outros fatores que indicam a presença de bactérias como esverdeamento da carne, odor e perda de vácuo. “Se embalagem a vácuo apresentar nem que seja apenas uma bolhinha de gás, não deve ser levada para casa, mesmo que a aparência da carne esteja normal e o odor não esteja forte”, alerta Pilar.
A questão ganha maior dimensão porque os próprios frigoríficos dificilmente respeitam os limites de temperatura para evitar a deterioração. Segundo a professora, um levantamento feito em frigorífico verificou que a carne é processada em ambiente com temperaturas próximas a 15°C, condição proibida pela Circular do Ministério de Agricultura nº 175, de 16 de maio de 2005, que preconiza uma temperatura máxima de 7°C e uma temperatura ideal de 0 a 6°C em todas as etapas de produção até a comercialização de produtos cárneos.
“Respeitar os limites seria o primeiro ponto a ser observado para se evitar a deterioração do produto”, defende. No entanto, os custos para manter a carne refrigerada nas temperaturas baixas são altos. Um exemplo seriam as leis trabalhistas, que não permitem aos operadores das câmaras frias cuja temperatura seja abaixo de 15°C trabalhar mais que duas horas nestas condições. Esse aspecto implicaria uma rotatividade muito maior de pessoal e, com isso, elevaria os custos do processo. Sem contar outros problemas de ordem logística.
Carnes embaladas a vácuo
Carnes embaladas a vácuo, se mantidas em temperaturas acima de 15°C podem se deteriorar mais rapidamente do que as dispostas em temperaturas mais baixas, próximas a 4°C. As temperaturas altas apresentam condições favoráveis para a proliferação de microrganismos contaminantes e prejudiciais à saúde humana, e à consequente diminuição da vida de prateleira.
A pesquisa conduzida por Rafael Chaves será apresentada no final de agosto no Congresso Food Micro2010 de Microbiologia de Alimentos, na Dinamarca, e traz uma importante contribuição para se entender todo o processo de deterioração pelos microrganismos desde o abate do boi até a chegada nas prateleiras de supermercado.
Inicialmente, Rafael analisou sete amostras contaminadas e cinco não contaminadas, com o objetivo de identificar as bactérias envolvidas no defeito de estufamento da embalagem da carne. Entre as bactérias identificadas estavam as lácticas, assim chamadas por serem encontradas em produtos lácteos e que podem ser benéficas ou maléficas para a saúde humana, e as enterobactérias, de origem fecal. Segundo o biólogo, dentre as culturas deteriorantes isoladas, 50% eram Hafnia alvei.
Numa segunda etapa das pesquisas, Chaves inoculou cada um dos isolados, que somaram 17 enterobactérias e sete bactérias lácticas em cada amostra de bifes, e posteriormente foram selados a vácuo, submetidos a termo encolhimento e estocados a 4°C e 15°C.
A ideia foi simular o abuso de temperatura para comparar os dados do comportamento dos grupos de microrganismos. “Todos os procedimentos para embalar os bifes a vácuo foram observados rigorosamente para que a simulação ficasse o mais próximo do que realmente é praticado na indústria”, explica Chaves.
Os resultados apontaram que a 15°C o quadro de contaminação se forma mais rapidamente. Em torno de sete dias, a bactéria Hafnia alvei reproduziu o defeito de estufamento da embalagem.
No caso das amostras mantidas a 4°C, o período para o início do estufamento foi de seis semanas e também correspondeu à Hafnia alvei. Ou seja, o abuso da temperatura propiciou a proliferação mais rápida da bactéria. Contudo, os pesquisadores alertam ainda que algumas das bactérias com maior expressão na reprodução do defeito eram patogênicas, entre elas Klebsiella pneumoniae, Yersinia enterocolitica e Escherichia coli.
Cuidado no churrasco
A carne, como muitos outros produtos, lembra a professora Pilar, é muito perecível por conter quantidade elevada de nutrientes que permitem um ambiente favorável para os microrganismos. Portanto, é preciso tomar uma série de cuidados antes de ingeri-la. É importante conhecer a procedência e manter o produto sob refrigeração.
“Em um churrasco, por exemplo, um hábito comum é manter a carne fora da geladeira por duas ou três horas. Isso não é recomendado. A carne deve ficar sob refrigeração até ser colocada no fogo. São aspectos como esse que devem ser observados com cuidado para se evitar contaminação”, alerta a professora.
Outros pontos fundamentais que não devem ser esquecidos pelas autoridades de fiscalização, segundo a docente, seriam as condições de higiene, limpeza e de abate dos animais nos frigoríficos.
Fonte: Diário da Saúde (acessado em 02/09/10)