Febre de Oropouche: saiba mais sobre a doença que é semelhante à dengue

Primeiras mortes foram confirmadas no País e cinco casos foram registrados no estado de São Paulo
Texto: Comunicação CRMV-SP / Foto: Adobestock

A Secretaria de Estado da Saúde de São Paulo (SES-SP) confirmou na última semana cinco casos da febre de oropouche na região do Vale do Ribeira, todos surgidos na própria região (autóctones). Com os registros em São Paulo, o Brasil chega a 7.653 confirmações e concentra mais de 90% dos casos nas Américas, segundo relatório divulgado pela Organização Mundial da Saúde (OMS). A doença é causada por um arbovírus, tipo de vírus transmitido por insetos, que se propaga principalmente por meio da picada do Culicoides paraensis, popularmente conhecido como mosquito pólvora ou maruim.

Quatro das ocorrências da doença confirmadas foram registradas em abril no município de Cajati, e uma em maio na cidade de Pariquera-Açu. Todos os pacientes evoluíram para cura. Entretanto, o crescente número de infectados preocupa e o Ministério da Saúde já registrou os dois óbitos decorrentes da febre de oropouche na Bahia, os primeiros no País. Os casos foram de mulheres com menos de 30 anos, sem comorbidades e que tiveram sinais e sintomas semelhantes a um quadro de dengue grave.

No ciclo silvestre da doença, bichos-preguiça e primatas não-humanos, além de aves silvestres e roedores, atuam como hospedeiros do vírus. Já no ciclo urbano, os humanos são os principais hospedeiros e o vetor Culex quinquefasciatus, o comum pernilongo também pode estar envolvido na transmissão em áreas urbanas.

“Após picar uma pessoa ou animal infectado, o vírus Oropouche (OROV) permanece no corpo do inseto vetor por alguns dias. Durante esse tempo, o vírus se replica. Quando o inseto infectado, pica uma pessoa saudável, ele pode transmitir o vírus, iniciando um novo ciclo de infecção”, explica a presidente da Comissão de Saúde Pública do Conselho Regional de Medicina Veterinária do Estado de São Paulo (CRMV-SP), Adriana Maria Lopes Vieira, ressaltando que essa forma de transmissão é comum entre arbovírus, em que o inseto atua como um vetor biológico, permitindo que o vírus se espalhe entre os hospedeiros humanos e animais.

Desde 1960 há relatos de casos isolados e surtos na região amazônica e atualmente o vírus está circulando de forma endêmica em toda essa região e em estados do Nordeste. De acordo com o Painel de Monitoramento das Arboviroses do Ministério da Saúde, além de São Paulo, outros 22 Estados confirmaram casos autóctones neste ano: Acre (270), Alagoas (6), Amapá (21), Amazonas (3.228), Bahia (844), Ceará (122), Espírito Santo (441), Maranhão (28), Mato Grosso (17), Mato Grosso do Sul (1), Minas Gerais (194), Pará (81), Paraíba (1), Pernambuco (120), Piauí (29), Rio de Janeiro (94), Rondônia (1.710), Roraima (249), Santa Catarina (169), Sergipe (15) e Tocantins (8). Outros países acometidos são Panamá, Argentina, Bolívia, Equador, Peru e Venezuela.

O integrante da Comissão de Saúde Pública do CRMV-SP, Mário Ramos de Paula e Silva, destaca que essa é uma doença para a qual, mais do que nunca, é importante os municípios terem um comitê ou uma “sala de situação” em que o médico-veterinário seja um dos profissionais presentes. “É necessário que a vigilância de zoonoses esteja presente e que se definam protocolos de trabalho com a rede básica de saúde, com a rede de urgência e com a rede laboratorial, assim como de educação da população, para que realmente seja feito o melhor trabalho possível. Isso sim é um exemplo de uma só saúde, a saúde única.”

Transmissão

De acordo com o Ministério da Saúde, existem dois tipos de ciclos de transmissão da doença confirmados até o momento:

Ciclo silvestre: bichos-preguiça e primatas não-humanos, além de possivelmente aves silvestres e roedores, atuam como hospedeiros do vírus Oropouche (OROV). O vetor primário é o Culicoides paraenses (popularmente conhecido como mosquito-pólvora ou maruim), especialmente nas áreas onde ocorrem surtos em humanos, mas a transmissão também pode ocorrer por meio do Coquillettidia venezuelensis e do Aedes serratus.

Ciclo urbano: os humanos são os hospedeiros principais. O vetor primário também é o Culicoides paraenses. Esse inseto é altamente eficaz na transmissão do vírus em áreas urbanas. Eventualmente, o Culex quinquefasciatus pode transmitir o vírus em ambientes urbanos, mas seu papel é secundário em comparação ao mosquito-pólvora. O ciclo urbano do OROV depende, principalmente, da interação entre os humanos e o Culicoides paraensis, tornando esse inseto o principal responsável pelos surtos de febre oropouche nas cidades.

Sintomas e tratamento

Segundo notas técnicas divulgadas pela Secretaria de Estado da Saúde de São Paulo (SES-SP), a febre do oropouche apresenta semelhança clínica com casos febris de outras arboviroses, como dengue, febre amarela e chikungunya. Isso significa que os sintomas iniciais dessas doenças, como febre, dor de cabeça, e dores musculares e articulares, podem ser muito semelhantes, tornando difícil diferenciá-las clinicamente.

“É uma doença muito parecida com a dengue e a chikungunya, e parte dos pacientes podem ter a volta dos sintomas depois de uma a duas semanas. Então a pessoa tem os sintomas, melhora e depois volta tudo de novo. Isso é uma característica de oropouche que tem acontecido em aproximadamente 60% das pessoas doentes”, pondera Mário Ramos.

Já o quadro clínico agudo da doença outros sintomas relatados são tontura, dor retro-ocular, calafrios, fotofobia, náuseas e vômitos. Podem ocorrer, ainda, casos com acometimento do sistema nervoso central (meningite asséptica, meningoencefalite), especialmente em pacientes imunocomprometidos, e com manifestações hemorrágicas (petéquias, epistaxe, gengivorragia). A maioria dos casos tem evolução benigna, sem sequelas, e ainda não há tratamento específico.

Animais

Para o integrante da Comissão de Saúde Pública do CRMV-SP, em relação aos animais, qualquer alteração de comportamento natural deve ser encarada como suspeita, especialmente em áreas endêmicas. “Os sintomas são genéricos, relacionados a uma infecção viral, como febre, mialgia, mal-estar, sintomas gastrointestinais, entre outros.”

De acordo com Mário Ramos, os principais animais acometidos são os primatas não humanos (como saguis, macacos-prego etc.), aves silvestres e Xenarthras (como bichos-preguiça, tamanduás e tatus).

Com relação ao tratamento de animais, ainda não há nota técnica ou normatização sobre o assunto.

“São animais de risco. Creio que ainda estamos no início de uma tomada de decisão a esse respeito, e deve haver muita evolução”, declara Mário Ramos, lembrando que os animais, assim como na febre amarela, são sentinelas da doença, alertando para a presença da doença, especialmente, no ciclo silvestre.

Prevenção

De acordo com nota técnica para vigilância da febre de oropouche no estado de São Paulo, há algumas medidas que devem ser tomadas para evitar picadas de vetores, especialmente no caso de gestantes, já que a doença é transmitida para o feto, com casos de complicações.

“A febre oropouche é uma arbovirose em que há grande risco de transmissão vertical. Então, os bebês das gestantes acometidas podem ter problemas como teratogenia, aborto ou outros problemas neurológicos. Por isso, a proteção deve ser especial e os profissionais da saúde devem orientá-las quanto a isso”, destaca Mário Ramos.

Confira as principais formas de prevenção:

  •  Fazer a proteção de portas e janelas com mosquiteiros de malha fina;
  •  Usar roupas claras e que cubram os braços e as pernas;
  •  Usar na pele ou nas roupas expostas repelentes que contenham DEET, IR3535 ou icaridina (o uso deve estar estritamente de acordo com as instruções do rótulo do produto);
  •  Evitar atividades ao ar livre em locais de alta infestação de vetores.

Outras medidas que podem ser eficazes são:

  • Eliminar os criadouros onde o mosquito pólvora se reproduz;
  •  Não se expor no horário de pico do inseto, normalmente no fim da tarde;
  • Usar óleo corporal na pele, caso precise entrar em uma área infestada.
Notificação

Com base em nota técnica divulgada pelo Ministério da Saúde, com orientações sobre a vigilância da febre de ouropouche, verificada a presença de animais dos grupos mencionados mortos ou doentes, o médico-veterinário deverá preencher uma Ficha de Notificação/Investigação de Epizootias do Sistema de Informação de Agravos de Notificação (Sinan), enviar Plataforma SISS-Geo (https://sissgeo.lncc.br/apresentacao.xhtml) e encaminhar amostras para a rede laboratorial de referência.

“É possível fazer a localização com GPS pelo celular e tirar foto do animal caído, para que vá para um banco nacional. E essas amostras devem ser encaminhadas para a rede laboratorial de referência, que é o Instituto Adolfo Lutz. Mas ainda é preciso definir alguns protocolos, há muito o que se aprender, com a academia e pesquisadores, para que outros protocolos e diagnósticos sejam devidamente aprimorados”, destaca Mário Ramos.

Para a investigação sobre a área de risco (que pode ser área endêmica), o médico-veterinário também deve realizar a investigação entomológica, ou seja, investigar quais são os insetos que estão envolvidos na transmissão no local provável de infecção (LPI), para identificação taxonômica e diagnóstico virológico de artrópodes, com base no conhecimento prévio sobre os aspectos bioecológicos das espécies potencialmente envolvidas, a fim de identificar o vetor primário e definir as medidas de prevenção e controle pertinentes.

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