Violência interpessoal e autoprovocada é tema de curso on-line voltado à notificação de ocorrências

Oferecido pelo Núcleo Estadual Viva, com apoio do CRMV-SP, a ação visa à sensibilização e instrumentalização dos profissionais da saúde
Texto: Comunicação CRMV-SP / Foto: Freepik

A violência interpessoal e auto provocada é um grave problema de saúde, pois atinge de forma abrangente toda a sociedade, e traz inúmeras consequências. Visando ao seu enfrentamento, o Núcleo Estadual de Vigilância de Violências e Acidentes (Núcleo Viva), vinculado ao Centro de Vigilância Epidemiológica (CVE) da Secretaria de Estado da Saúde (SES), recebe inscrições, até 27/3, para a participação na terceira turma do curso on-line ‘Vigilância de Violências: Notificação de Violência Interpessoal e Autoprovocada’.

Iniciada em 2022, a ação tem o objetivo de sensibilizar profissionais da saúde quanto à notificação compulsória e seu adequado registro, e é apoiada pelo Grupo Técnico Interprofissional (GTI), vinculado ao Gabinete da Secretaria de Estado da Saúde de São Paulo, do qual o Conselho Regional de Medicina Veterinária do Estado de São Paulo (CRMV-SP) faz parte.

Propósito Epidemiológico

Segundo a coordenadora de Vigilância de Doenças e Agravos Não Transmissíveis do Centro de Vigilância Epidemiológica – Coordenadoria de Controle de Doenças – Secretaria de Estado da Saúde de São Paulo (CVC/CCD/SES-SP), Mirian Matsura Shirassu, o treinamento é um investimento da Secretaria com vistas a sensibilizar os profissionais da saúde para a importância da notificação adequada.

“Acreditamos já estarmos vendo os resultados, pois capacitamos 1.300 profissionais só no ano passado e, a partir disso, percebemos um aumento no número de notificações. Não podemos afirmar ainda, mas achamos que esse fato está relacionado ao treinamento”, afirma Miriam.

Ela explica que a notificação compulsória de violências tem propósito epidemiológico e difere da denúncia ou dos comunicados institucionais previstos em lei, como àqueles ao Conselho Tutelar, do Idoso, Ministério Público e autoridade policial.

 “A notificação é compulsória para os profissionais de saúde, independente da categoria, e para os responsáveis por estabelecimentos de saúde públicos e privados. E tem caráter sigiloso, garantido por lei”, informa a coordenadora.  

Chamamento a médicos-veterinários e zootecnistas

O acompanhamento das notificações, que são coletadas por meio da Ficha de Notificação Individual de Violência Interpessoal e Autoprovocada, possibilita ao Núcleo dimensionar a magnitude da violência no Estado, trazendo especificidade na caracterização das ocorrências, de suas circunstâncias, da pessoa que a sofreu e até do provável autor da agressão.

“Tais informações oferecem subsídios para tomada de decisão em saúde pública e norteiam políticas públicas. Servem, portanto, como um instrumento de cuidado, ao disparar uma série de ações que visam à atenção e proteção integral da pessoa que sofreu violência”, enfatiza Mirian. Por isso, ela faz um chamamento para que, diante de situações de violência, médico-veterinários e zootecnistas não deixem de informar a rede, e para que participem do curso.

“Sabemos que esses profissionais enfrentam situações de agressão no seu dia a dia de trabalho, mas são poucos os que nos informam sobre as ocorrências. No caso dos médicos-veterinários, especificamente, em análise do Banco de Violências (SINAN NET- SES-SP), 2022, percebe-se 16 notificações de lesão autoprovocada. Esses dados indicam uma demanda de prevenção de lesões autoprovocadas (16, em um total de 29). Alertamos, portanto, para a importância da notificação, a fim de que a condição real fique visível e para que possamos atuar”, destaca.

Ação efetiva

O curso EAD é realizado de forma assíncrona e tem três módulos teóricos: Violência – agravo de relevância à saúde pública; Princípios da Vigilância de Violências; e Preenchimento da Ficha de Notificação de Violências, segundo instrutivo do Ministério da Saúde.

O treinamento oferece, ainda, três módulos com vídeo-casos para vivência no preenchimento da ficha (Violência Sexual, Lesão Autoprovocada e Negligência). A partir da inscrição, que é gratuita, o participante já pode dar início ao seu treinamento, que deve ser finalizado até 31 de março. Para isso, basta que o interessado acesse a plataforma EAD/SES-SP (saude.sp.gov.br) e, faça o login e senha (que no primeiro acesso costuma ser o CPF do inscrito em ambos).

De acordo com o Núcleo Viva, a análise de dados é fundamental para a tomada de decisões baseadas em evidências. Por isso, para que o objetivo da ação seja efetiva, ou seja, que o treinamento propicie a instrumentalização e qualificação dos responsáveis pela notificação, é essencial que os participantes concluam o curso.

Tipos de violência

Conforme disposto no Relatório Mundial sobre Violência e Saúde, considera-se violência “o uso intencional da força física ou do poder, real ou em ameaça, contra si próprio, contra outra pessoa, ou contra um grupo ou uma comunidade, que resulte ou tenha possibilidade de resultar em lesão, morte, dano psicológico, deficiência de desenvolvimento ou privação”.

A violência autoprovocada é aquela infligida pelo próprio ser a si mesmo, como as tentativas de suicídio e as automutilações, que vemos ocorrer também entre animais. Já a interpessoal, compreende a violência doméstica e comunitária.

A primeira acontece entre membros da família ou do grupo sem função parental que tem convívio no âmbito doméstico. Pode ocorrer em qualquer espaço físico e se constitui como violência doméstica pela relação construída. A violência comunitária ocorre no ambiente social entre conhecidos ou desconhecidos.

Teoria do Elo

Quando se trata do contexto de atuação do médico-veterinário e do zootecnista, o conceito da violência pode ser estendido aos animais, que também são vítimas constantes desse mal. Há estudos que, inclusive, correlacionam o abuso contra animais e a violência doméstica, principalmente a praticada contra mulheres, idosos e crianças.

Essa conexão entre a violência animal e a violência interpessoal é conhecida como “Teoria do Elo”. Segundo essa teoria, os maus-tratos contra animais não são fatores isolados na sociedade, e sim indícios de problemas no núcleo familiar. Dessa forma, os maus-tratos aos animais são fortes indicativos de problemas sociais mais abrangentes, como a violência doméstica e o abuso infantil, por exemplo. 


Burnout

Os médicos-veterinários, conforme evidenciam os dados, figuram com destaque entre os casos de violência auto-provocada. De acordo com pesquisa realizada, de 2006 a 2009, pelo DataSUS (portal de dados do Sistema Único de Saúde – SUS) a profissão de médico-veterinário era a que tinha maior taxa de óbitos causados por esse tipo de violência.

Levantamento mais recente obtido pelo Tabnet DataSUS Mortalidade (Ministério da Saúde – MS/ Secretaria de Vigilância à Saúde – SVS/ Coordenação-Geral de Informações e Análises Epidemiológicas – CGIAE/ Sistema de Informações sobre Mortalidade – SIM) apontou que, no estado de São Paulo, foram identificados três óbitos, em 2019, e dois, em 2021, relacionados à ocupação de médico-veterinário; e um óbito, em 2020, de zootecnista. E, conforme apurado nas notificações de 2022, informadas por Mirian, de 29 casos de violência comunicadas por médicos- veterinários, 16 foram autoprovocadas.

Sobre isso, a médica-veterinária Adriana Maria Lopes Vieira, presidente da Comissão Técnica de Saúde Pública Veterinária do CRMV-SP, ressalta que os riscos ocupacionais têm sido relatados como um problema em diversas partes do mundo e o burnout  (distúrbio psíquico caracterizado pelo estado de tensão emocional e estresse provocados por condições de trabalho) já figura como um problema de saúde pública.

“Apesar da Medicina e da Medicina Veterinária terem evoluído em vários aspectos, alguns temas continuam sendo estigmatizados. Falar de violência e saúde mental ainda é um tabu. Ter o tema abordado por instituições e órgãos públicos, inclusive da classe médica-veterinária, mostra que é importante falarmos sobre a questão abertamente, buscando medidas preventivas no ambiente de trabalho, e que o médico-veterinário precisa cuidar de sua saúde integral”, afirma Adriana.

Dados

Os dados obtidos pelo Sinan Net Violências (Centro de Vigilância Epidemiológica – CVE/ Coordenadoria de Controle de Doenças – CCD/ Secretaria de Estado da Saúde de São Paulo – SES-SP), separados por ocupação profissional das vítimas, mostram que, em 2021, ocorreram 19 notificações de violência interpessoal e autoprovocada de médicos-veterinários, e duas de zootecnistas. A partir disso, os dados de 2022 mostram aumento de 10 registros entre os primeiros, que subiram para 29, e queda entre os zootecnistas, sem nenhum registro no ano passado. Nesse período, o total de notificações, independentemente da ocupação, foi de 130.253.

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