A oferta de graduações na modalidade Ensino a Distância (EaD) é crescente e indiscriminada. Com isso, o que deveria ser uma contribuição tecnológica para a formação, passa a substituir processos práticos fundamentais, tornando-se um risco à qualidade profissional e, consequentemente, à saúde coletiva, que envolve vida humana, animal e ambiental.
De acordo com a Portaria do Ministério da Educação (MEC) nº 23/17, são consideradas graduações EaD os cursos que possuem, no mínimo, 70% de sua carga horária total aplicadas de forma on-line.
Para se ter uma ideia, no cadastro do MEC constam, atualmente, cinco instituições com cursos de Medicina Veterinária EaD aprovados para atuação no Estado de São Paulo. Elas totalizam 22 polos em cidades paulistas, dos quais um, em Lorena, disponibilizou 100 vagas.
“O EaD é um recurso adicional, não uma modalidade de formação”, enfatiza o médico-veterinário e presidente do CRMV-SP, Mário Eduardo Pulga, que alerta sobre os danos que a ausência de interface humana acarreta ao desenvolvimento de competências específicas, as quais são alcançadas a partir do aprendizado prático, bem como a humanização nas diferentes frentes de atuação profissional.
Entraves
Se os desafios começaram a surgir com a influência da digitalização dos processos globais, os entraves ganharam novas proporções, em 2017, depois da publicação do Decreto Federal nº 9.057 e da Portaria Normativa nº 11, que autorizaram a oferta de cursos de educação básica e superior na modalidade a distância.
Em 2018, um agravante: a publicação da Portaria MEC nº 1.428, a qual permite a ampliação do limite de disciplinas EaD para cursos de graduação presencial de 20% para 40%. Exceção apenas aos cursos das áreas de Saúde e de Engenharias, no entanto, a graduação em Medicina Veterinária é enquadrada no campo das Ciências Agrárias pelo MEC, o que representa uma ameaça.
Equilíbrio
De acordo com a presidente da Comissão Técnica de Educação do CRMV-SP, Dra. Helenice de Souza Spinosa, o EaD deve ser reservado para disciplinas teóricas que não exijam interface humana e prática. “Em um mundo tecnológico, é preciso encontrar esse equilíbrio, que é sinônimo de prudência e indispensável.”
A resposta do Sistema CFMV/CRMVs foi a publicação da Resolução CFMV nº 1.256/19, que veda o registro de profissionais graduados na modalidade a distância, bem como estabelece como falta ético-profissional o exercício do ensino da Medicina Veterinária em cursos EaD. “O CRMV-SP se mantém atuante junto ao Fórum dos Conselhos Atividade Fim Saúde de São Paulo (FCAFS-SP) nas discussões e ações sobre o assunto”, destaca Helenice.
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(Helenice de Souza Spinosa)
Qualidade
Outro fator que interfere na qualidade da formação é o excesso de faculdades. Hoje, o Brasil possui 384 graduações em Medicina Veterinária, sendo que 76 escolas estão no Estado de São Paulo. Para o presidente do CRMV-SP, parcela considerável das instituições não possui como missão oferecer uma formação alinhada às necessidades do mercado e novas demandas para a saúde humana e animal. “Será que essas universidades estão preparando os profissionais para o futuro?”, indaga Pulga.
Helenice destaca a aplicação de provas como uma medida para mensurar a qualidade dos profissionais. Atualmente, o Sistema CFMV/CRMVs dialoga sobre a possibilidade de exames para progressos (alunos em formação), e egressos (após a finalização da graduação).
“Além disso, a acreditação de cursos, já realizada pelo CFMV, é um recurso para nortear os jovens que querem ingressar no ensino superior”, diz.
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(Mário Eduardo Pulga)