Com a disseminação do Sar-CoV-2, as atenções se voltaram à Covid-19. Outras doenças graves, porém, também precisam de um olhar cuidadoso. É o caso da raiva, que, em animais, passou a apresentar sinais diferentes dos observados no passado, o que pode acarretar a identificação tardia da zoonose e uma perda no aspecto preventivo.
É o que alerta o Prof. Dr. Sílvio Arruda Vasconcellos, secretário-geral do Conselho Regional de Medicina Veterinária do Estado de São Paulo (CRMV-SP). “A clássica agressividade nos animais infectados não tem sido observada. Já paralisias, salivação e ausência de apetite são sinais considerados mais comuns na atualidade.”
No Estado, segundo a Prof. Dra. Valéria Gentil de Tommaso, que integra a Comissão Técnica de Políticas Públicas do CRMV-SP e atua no Instituto Pasteur, a mudança no perfil clínico da doença está atrelada ao fato de que, desde 1998, a variante 2 (canina) do vírus rábico não circula. “Houve, apenas casos isolados em cães e gatos, com variantes de morcegos.”
De 2002 a 2020, no estado de São Paulo, foram registrados 13 casos de raiva em cães e 20 em gatos. “O número é relativamente pequeno, porém, não podem ser desconsideradas subnotificações ou, ainda, a não detecção de casos, uma vez que houve mudança no perfil clínico da doença”, diz Valéria.
Sintomas neurológicos e o diagnóstico diferencial
Neste contexto, é preciso que os médicos-veterinários clínicos estejam atentos a animais com sintomas neurológicos e incluam a raiva no diagnóstico diferencial. De acordo com a Nota Informativa nº13/19 do Ministério da Saúde (MS), foram elencados os seguintes critérios em cães e gatos:
Com sinais e sintomas neurológicos que foram a óbito ou submetidos à eutanásia; que morreram no período de observação de 10 dias após a agressão; os encontrados mortos por atropelamento ou sem causa definida; e suspeitos de raiva, advindos de clínicas particulares, faculdades ou outros estabelecimentos, que foram a óbito ou submetidos à eutanásia.
Vírus identificado em morcegos frugívoros
Outro ponto que Vasconcellos enfatiza merecer destaque é o fato de ter sido identificado o vírus circulando em populações de morcegos frugívoros, em diversos estados brasileiros. O risco, nesse contexto, se dá pelo contato destes com morcegos hematófagos, de forma a transmitir o vírus aos que se alimentam de sangue.
“Como se sabe, os frugívoros podem, ainda, cair em locais em que transitam pessoas e animais, o que facilita a ocorrência de mordidas acidentais, por meio das quais pode haver transmissão do vírus”, frisa Vasconcellos. O alerta é ainda maior se considerado que 90% das espécies de morcegos identificadas com raiva estão em áreas urbanas, de acordo com o MS.
O papel do médico-veterinário
Os profissionais da Medicina Veterinária, em especial o clínico, têm papel fundamental na vigilância da raiva, uma vez que, na rotina de atendimento, será o primeiro a avaliar o animal doente, identificar a suspeita e notificar o serviço público. Também por isso, os profissionais devem manter-se prevenidos contra a raiva, com seus controles sorológicos anuais.
“O médico-veterinário é estratégico, ainda, na orientação dos tutores quanto ao comportamento de cães e gatos e quanto à prevenção de mordeduras”, destaca Valéria, que ainda argumenta que, no Estado, há aproximadamente 120 mil atendimentos antirrábicos humanos anualmente, dos quais 85%, em média, são causados por cães e, 12%, por gatos.
Confira quais as instituições que realizam o diagnóstico laboratorial da raiva, aqui no estado de São Paulo:
– Instituto Pasteur (Secretaria de Saúde do Estado de São Paulo);
– Instituto Biológico (Secretaria da Agricultura e Abastecimento do Estado de São Paulo);
– Centro de Controle de Zoonoses (Secretaria de Saúde do município de São Paulo);
– Faculdade de Medicina Veterinária e Zootecnia da Universidade de São Paulo (FMVZ-USP);
– Faculdade de Medicina Veterinária e Zootecnia da Universidade Estadual Paulista (FMVZ-Unesp), campus Botucatu;
– Faculdade de Medicina Veterinária e Zootecnia (FMVZ-Unesp), campus Araçatuba.