Esporotricose avança em São Paulo e acende alerta para saúde pública

Gatos são os mais afetados e desempenham papel central na cadeia de transmissão, o que torna a doença um dos principais desafios sanitários urbanos no Brasil
Texto: Comunicação CRMV-SP / Foto: Freepik

O Conselho Regional de Medicina Veterinária do Estado de São Paulo (CRMV-SP) faz um alerta e emita nota técnica sobre o avanço da esporotricose animal no estado. A zoonose, causada por fungos do gênero Sporothrix, tem se expandido de forma preocupante e já representa um impacto significativo na saúde animal e humana. Os gatos são os mais afetados e desempenham papel central na cadeia de transmissão, o que torna a doença um dos principais desafios sanitários urbanos relacionados a zoonoses no Brasil.

Em São Paulo, os registros da doença em animais eram pontuais até 2010. A partir de 2011, no entanto, os casos passaram a crescer de forma expressiva, com o primeiro grande surto identificado na Zona Leste da capital. Desde então, a esporotricose vem se espalhando para municípios da Região Metropolitana e do litoral paulista, indicando um processo contínuo de expansão territorial.

Entre 2022 e 2023, o número de casos confirmados de esporotricose animal no Estado aumentou de 2.417 para 3.309, evidenciando a aceleração da epidemia. Apesar desse crescimento, a notificação da doença em animais ainda não é obrigatória na maior parte do território paulista, o que dificulta a mensuração real do problema e o planejamento de estratégias eficazes de controle.

Os dados em humanos reforçam o cenário de alerta. O número de casos registrados cresceu de forma contínua entre 2011 e 2024, especialmente nas regiões metropolitanas. Diante desse avanço, a esporotricose humana passou a integrar, a partir de 2025, a lista nacional de doenças de notificação compulsória, com registro obrigatório no Sistema de Informação de Agravos de Notificação (Sinan).

Transmissão da doença

A coordenadora técnica médica-veterinária do CRMV-SP, Carla Maria Figueiredo de Carvalho, explica que os gatos desempenham papel central na cadeia de transmissão da esporotricose, em razão da alta concentração do fungo em lesões cutâneas, garras e nas cavidades oral e nasal. “Eles contraem a doença por inoculação traumática, seja pelo contato com solo – ao cavar – com espinhos, lascas de madeira ou matéria orgânica contaminados, seja pelo contato direto com outros animais doentes, principalmente durante brigas, arranhões e mordeduras, ou, ainda, pelo contato com secreções de lesões cutâneas, considerada a principal via de contaminação”, afirma.https://crmvsp.gov.br/wp-content/uploads/2025/08/NOTA-TECNICA-00001.2025-ESPOROTRICOSE-CRMV_SP-15.12.2025_DRA-DANIELA-CHIEBAO.pdf

Nesse contexto, gatos com maior acesso às ruas apresentam maior risco de infecção e disseminação da doença. Enquadram-se nesse grupo os animais não castrados, não domiciliados ou em situação de abandono, além dos machos, que tendem a ter comportamento mais territorialista e maior propensão a brigas, o que aumenta a suscetibilidade à infecção pelo fungo, que pode ocorrer tanto através de contato com o ambiente, como com animais doentes.

Atenção aos sintomas em humanos

Os sintomas da esporotricose em humanos podem surgir entre poucos dias e até três meses após a infecção. Geralmente, a doença se manifesta inicialmente como um pequeno nódulo indolor que, com o tempo, pode aumentar de tamanho e evoluir para uma ferida aberta. “As formas clínicas da esporotricose humana dependem do estado imunológico do paciente e da profundidade das lesões, podendo se apresentar de forma cutânea, atingindo a pele, o tecido subcutâneo e o sistema linfático, ou de forma extracutânea, com disseminação para órgãos como pulmões, ossos e articulações”, explica Carla Maria.

A médica-veterinária ressalta que o atendimento médico deve ser procurado assim que surgirem lesões, nódulos, úlceras ou feridas que não cicatrizam, especialmente quando há histórico de contato com animais doentes ou com solo e material orgânico possivelmente contaminados pelo fungo. “O diagnóstico e o tratamento precoces são fundamentais para evitar a progressão da doença”, alerta.

Quando não tratada adequadamente, a esporotricose pode evoluir para feridas extensas e formação de nódulos. Em indivíduos imunossuprimidos, a infecção pode se disseminar para além da pele. “Nesses casos, o acometimento dos pulmões pode provocar sintomas como falta de ar, dor ao respirar e febre. Já a disseminação para ossos e articulações costuma causar inchaço e dor, especialmente durante os movimentos”, diz a coordenadora técnica do CRMV-SP.

Enfrentamento da doença

O enfrentamento da esporotricose exige a adoção de um conjunto integrado de medidas por parte do poder público e da sociedade. Entre as principais ações está o diagnóstico precoce e o tratamento adequado tanto dos animais quanto das pessoas acometidas pela doença, estratégia considerada essencial para reduzir a gravidade dos casos e conter a disseminação do fungo.

“Outra medida fundamental é o isolamento de animais doentes, especialmente gatos, a fim de evitar o contato com outros animais e com seres humanos, diminuindo o risco de transmissão”, explica o diretor técnico do CRMV-SP, Leonardo Burlini. O médico-veterinário também ressalta a importância da orientação à população, com foco nos responsáveis por felinos, sobre os riscos da doença, suas formas de transmissão, os sinais clínicos e a necessidade de não abandonar animais infectados.

Além disso, a atuação articulada dos serviços de vigilância em saúde é apontada como decisiva para o controle da esporotricose. “A implementação contínua e coordenada dessas ações é indispensável para interromper as cadeias de transmissão e proteger a saúde pública”, orienta Burlini.

Vigilância, diagnóstico e controle

As ações de vigilância e controle da esporotricose felina devem seguir as orientações do Ministério da Saúde e das secretarias estadual e municipais, com atuação das Unidades de Vigilância em Zoonoses (UVZs).

Gatos com sinais suspeitos devem ser avaliados por médico-veterinário e, sempre que possível, submetidos a exames laboratoriais para confirmar o diagnóstico. Quando os exames não estão disponíveis, pode ser adotado o diagnóstico clínico-epidemiológico. O tratamento deve seguir protocolos reconhecidos, com isolamento do animal e cuidados rigorosos de higiene do ambiente para evitar a transmissão.

Em casos excepcionais, como quadros graves, impossibilidade de tratamento ou ausência de resposta terapêutica, a eutanásia pode ser indicada. O procedimento deve ser realizado ou acompanhado por médico-veterinário, conforme as normas éticas e legais do Conselho Federal de Medicina Veterinária (CFMV).

Notificação compulsória

O Ministério da Saúde incluiu a esporotricose humana na Lista Nacional de Notificação Compulsória por meio da Portaria GM/MS nº 6.734/2025. Com isso, todos os casos da doença em pessoas devem ser obrigatoriamente comunicados à autoridade sanitária do município onde foram identificados.

No estado de São Paulo, alguns municípios já possuem normas próprias que exigem a notificação de casos suspeitos e confirmados em humanos, além de casos confirmados em animais, como cães e gatos. Entre eles estão São Paulo, Catanduva, Diadema, São Bernardo do Campo, Ferraz de Vasconcelos e Santa Bárbara d’Oeste, que disponibilizam fichas de notificação específicas e canais oficiais para o envio dessas informações às secretarias municipais de saúde. Confira:

Embora a esporotricose animal ainda não faça parte da lista nacional de notificação obrigatória, o Ministério da Saúde orienta que esses casos também sejam comunicados. A recomendação consta na Nota Técnica nº 60/2023, que indica a notificação às autoridades de saúde por e-mail, telefone ou por meio de formulário eletrônico específico: https://redcap.link/esporotricoseanimal.

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