A saga de reintrodução da ararinha-azul na caatinga brasileira vai começar com uma travessia atlântica. Cinquenta aves da espécie, extinta na natureza há quase duas décadas, deverão migrar em breve, da Alemanha para o Brasil, para compor a população que vai repovoar o sertão baiano, a partir de 2019.
O acordo para que isso aconteça deverá ser assinado, nesta segunda-feira (25/06), pelo ministro do Meio Ambiente, Edson Duarte, numa reunião na Bélgica, onde estão quatro das 158 ararinhas-azuis existentes hoje no mundo, todas em cativeiro.
“Estamos cada vez mais próximos do momento de elas chegarem em casa”, disse Ugo Vercillo, diretor do Departamento de Conservação e Manejo de Espécies, do Ministério do Meio Ambiente.
Descoberta, no início do século 19, pelo naturalista alemão Johann Baptist von Spix, a ararinha-azul (Cyanopsitta spixii), exclusiva da caatinga brasileira, teve sua população dizimada pela captura e tráfico de animais silvestres. O último exemplar conhecido na natureza desapareceu, em outubro de 2000, e até hoje não se sabe se morreu ou foi capturado por alguém.
Unidades de conservação
Naturalmente rara, a “spix” só existia originalmente numa pequena região do interior de Juazeiro e Curaçá, no norte da Bahia, onde o governo federal criou no início, deste mês, duas unidades de conservação: o Refúgio de Vida Silvestre e a Área de Proteção Ambiental da Ararinha-Azul, destinadas à reintrodução e proteção da espécie.
A transferência das aves deve começar no primeiro trimestre de 2019. “Até 2022, esperamos ter a ararinha-azul reintroduzida com sucesso na natureza”, afirma a médica-veterinária Camile Lugarini, pesquisadora do Centro Nacional de Pesquisa e Conservação de Aves Silvestres (Cemave), do Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio) e responsável pelo Plano de Ação Nacional para Conservação da ararinha-azul.
Processo cauteloso
As primeiras solturas serão feitas em conjunto com maracanãs (Primolius maracana), uma outra espécie com hábitos semelhantes aos da ararinha. Ambas, por exemplo, utilizam ocos de caraibeira (ipê-amarelo) para fazer seus ninhos. Antes de desaparecer, o último macho de “spix” chegou a formar par com uma fêmea de maracanã.
Pesquisadores do ICMBio, em parceria com a população local, estudam o comportamento das maracanãs para aprender mais sobre a espécie e, com base nisso, planejar a liberação e o monitoramento das ararinhas. “Acredito que muito do que estamos aprendendo com as maracanãs servirá para a ararinha-azul”, aposta Camile.
Esperança
As 50 aves que virão ao Brasil estão sob a guarda da Associação para a Conservação de Papagaios Ameaçados (ACTP), uma organização privada sem fins lucrativos que, hoje, mantém 90% das ararinhas-azuis em cativeiro do mundo, após o fechamento de uma instituição no Catar, que transferiu seu plantel para Berlim, no início deste ano.
“É uma responsabilidade enorme”, disse Martin Guth, presidente da ACTP, que pagará pelo novo centro de criação e reprodução na Bahia. Produzir as aves não será problema, garante o diretor científico da associação, Cromwell Purchase, que está ansioso para iniciar a reintrodução. “Todas as peças estão começando a se encaixar do jeito que a gente sonhava”.