“Fiscalização é fundamental para evitar que mais castrações sejam realizadas de forma inadequada”, diz assessor técnico do CRMV-SP

Combater a superpopulação de cães e gatos é, atualmente, um dos maiores desafios das organizações não governamentais, grupos de proteção animal e prefeituras. Algumas notícias apontam para cerca de dois milhões de animais desamparados pelas ruas de São Paulo, porém, não existe uma quantidade exata oficial. De acordo com o Centro de Controle de Zoonoses (CCZ), ligado à Secretaria Municipal de Saúde, a maior dificuldade para se chegar a um número preciso é saber se o animal tem dono, se foi abandono ou simplesmente fugiu. Seja qual for o valor real , o fato é que animais que vivem pelas ruas podem causar transtornos, como acidentes ou ataque a pessoas, e transmitir doenças a seres humanos, como raiva, leishmaniose, esporotricose e sarna.

“A castração é um dos recursos mais importantes no combate à reprodução descontrolada de animais”, afirma o médico-veterinário e assessor técnico do CRMV-SP, Leonardo Burlini. Mestre e doutor em Ciências Veterinárias pela Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro (UFRRJ), Leonardo acompanha de perto os projetos de mutirão de castração que são submetidos para aprovação peloConselho. Segundo ele, ainda há muitos procedimentos que são realizados sem o conhecimento do CRMV-SP e em condições inadequadas.

Com o objetivo de orientar médicos-veterinários e promover mais saúde e bem-estar aos animais, o CRMV-SP publicou em 2016 a Resolução Nº 2579, que detalha novas normas para mutirões de castração, como a necessidade de uma estrutura física adequada para a realização das cirurgias e dos organizadores indicarem uma clínica ou hospital veterinário para atendimento de emergências. O texto também determina que cães e gatos não sejam misturados no mesmo ambiente para evitar acidentes. “A Resolução trouxe informações mais claras sobre o que é necessário para que um mutirão de castração seja realizado de forma segura”, explica Burlini, que também atuou como fiscal do CRMV-SP, coordenador e fiscal estadual agropecuário no Estado do Ceará.

Em entrevista ao Informativo CRMV-SP, Leonardo falou sobre os falhas técnicas observados em mutirões de castração, que estão redundando em processos éticos e da importância das fiscalizações realizadas pelo Conselho. Confira:

Quais são os maiores problemas observados em mutirões de castração?

Infelizmente, alguns mutirões continuam sendo realizados sem a prévia apresentação dos projetos para avaliação e aprovação do CRMV-SP, o que contraria as Resoluções Nº 2579/2016 (CRMV-SP) e Nº 962/2010 (CFMV). Nossos fiscais observam, principalmente, os seguintes problemas: falhas na antissepsia e paramentação da equipe cirúrgica constatadas no interior da sala de cirurgia; lavagem e esterilização de materiais em espaço improvisado; ausência de sistema de iluminação emergencial própria; falta de suportes para soluções de fluidoterapia ou local para fixação das mesmas no ambiente pós-cirúrgico; falta de itens necessários no ambiente para o trans operatório, como equipamentos para anestesia inalatória com ventiladores mecânicos, foco cirúrgico, aspirador cirúrgico, sistema de provisão de oxigênio e laringoscópio, entre outras condições insatisfatórias de ordem estrutural, higiênico-sanitária e organizacional. A fiscalização ainda relatou que em um determinado mutirão, o ambiente pós-operatório também servia como espaço para a venda de medicamentos e de outros artigos para animais.

Como é a atuação do CRMV-SP junto às organizações que promovem mutirões?

Assim que os projetos de mutirão de castração chegam ao CRMV-SP, o Setor de Registro de Empresas faz a análise inicial dos documentos e os encaminha para a Assessoria Técnica Médico-Veterinária, para análise técnica. Posteriormente, há o encaminhamento para o Plenário do Conselho, e na sequência, as informações são passadas ao setor de fiscalização. Em seguida, os fiscais vão a campo e elaboram os relatórios técnicos onde fazem seus apontamentos e considerações sobre as condições encontradas nos locais. Os resultados das fiscalizações são encaminhados à diretoria do Conselho, que avaliará os casos de forma independente e adotará as medidas cabíveis, que podem incluir a instauração de processo ético-profissional. Vale ressaltar que mutirões não aprovados também são fiscalizados.

Qual a importância das fiscalizações realizadas pelo CRMV-SP nos mutirões?

Por meio delas, o Conselho tem a possibilidade de verificar como os mutirões estão sendo realizados. Com esse diagnóstico, são direcionadas as ações de orientação e de elaboração de normas. A fiscalização do exercício profissional, nestas e nas demais atividades, é fundamental para evitar que mais castrações sejam realizadas de forma inadequada. Somente assim e que ficam asseguradas as condições de saúde pública, animal e ambiental, exigidas pelo código de ética profissional.

Qual foi o impacto da Resolução Nº 2579/2016 que o CRMV-SP estabeleceu para normatizar os mutirões?

A Resolução trouxe informações mais claras sobre o que é necessário para realizar um mutirão de forma segura. Além das exigências relativas aos procedimentos, equipamentos e materiais necessários, a norma também conta com um modelo de projeto de mutirão, que auxilia os responsáveis técnicos (RT) na elaboração de suas propostas.
O número de processos éticos referentes a mutirões de castração cresceu nos últimos anos, assim como a quantidade de organizações oferecendo esses serviços.

Quais são os cuidados que um médico-veterinário deve ter antes de tornar-se o responsável técnico (RT) de projetos de mutirão de castração?

O médico-veterinário deverá certificar-se que realmente terá autonomia para planejar e organizar o mutirão, considerando todos os aspectos técnicos indispensáveis, o que inclui os equipamentos e materiais mínimos necessários. Ele deve ter condições de ser, de fato, o protagonista da ação. É ele quem deve definir o local das atividades, considerando-se os recursos físicos, sociais e de infraestrutura, facilidade de acesso, probabilidade de ocorrências que possam afetar seres humanos e/ou animais e estimativa de pacientes a serem atendidos. Precisa conhecer previamente o local onde o mutirão será realizado para verificar a ambientação adequada à correta realização dos procedimentos. O profissional deve ter ciência que ele será responsável por todo o mutirão e por promover a gestão da qualidade em todas as etapas do processo, que inclui a limpeza e esterilização do material; qualidade e validade dos medicamentos e outros insumos; assepsia e antissepsia dos procedimentos cirúrgicos; gerenciamento de resíduos; procedimentos anestésicos e cirúrgicos; período de recuperação anestésica; definição e manutenção dos fluxos técnicos e administrativos; além de zelar e fazer cumprir as exigências da legislação vigente, entre outros cuidados. Também é função do RT orientar tecnicamente os responsáveis pelos animais, por escrito, apresentado em um documento completo, claro e que atinja o objetivo.
É importante frisar que os conselhos regionais de Medicina Veterinária não são contra os mutirões de castração e ações de ONG’s, porém, as mesmas devem seguir normas de segurança e firmar parcerias com hospitais veterinários, clínicas ou prefeituras para oferecer o mínimo de estrutura necessária para que as cirurgias ocorram dentro da normalidade.
O CRMV-SP é a favor de toda e qualquer ação em prol da saúde pública, animal e ambiental, alicerçadas por preceitos técnicos, científicos e éticos. Os procedimentos de castração devem fazer parte das políticas públicas que atendam à saúde única e ao bem-estar dos animais. Assim como existem normas para estabelecimentos médico-veterinários (clínicas e hospitais veterinários), também há para a realização de mutirões que ocorram fora destes estabelecimentos. Conforme a Resolução Nº 2579/2016, os mutirões só podem ser realizados por entidades ou instituições devidamente reconhecidas como de utilidade pública, faculdades de Medicina Veterinária e órgãos públicos, ou em parceria com alguma destas instituições. Quando não realizados em clínicas ou hospitais veterinários, os mutirões devem ocorrer em área física que possua estrutura adequada, incluindo ambientes para recepção dos responsáveis pelos animais, pré-operatório, antissepsia e paramentação, trans-operatório, pós-operatório, lavagem e esterilização de materiais, alimentação da equipe, espera para os responsáveis e sanitários para uso da equipe e do público. Estes cuidados são necessários para a garantia da segurança, eficácia e qualidade do serviço oferecido à sociedade zelando pela saúde e bem-estar dos animais atendidos.

Recentemente, foi sancionada a Lei Federal Nº 13.426/2017, que cria uma política de controle de natalidade de cães e gatos por meio de cirurgia de esterilização ou outro procedimento “que garanta eficiência, segurança e bem-estar ao animal”. Os programas de castração deverão considerar um estudo das localidades que necessitem de atendimento prioritário ou emergencial, seja por superlotação ou por quadros epidemiológicos. Fale mais sobre essas mudanças.

O controle de natalidade de cães e gatos em todo o território nacional será regido de acordo com a lei, mediante esterilização permanente por cirurgia ou por outro procedimento que garanta segurança, eficiência e bem-estar ao animal. Animais pertencentes ou localizados nas comunidades de baixa renda terão prioridade para serem atendidos. A lei determina também a execução de campanhas educativas pelos meios de comunicação, com noções de ética sobre a posse responsável de animais domésticos.

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