Série Zoonoses: LEISHMANIOSE VISCERAL

O que é?

A leishmaniose visceral (LV) é uma doença que acomete o homem e diversas espécies de animais silvestres e domésticos, sendo o cão o reservatório mais importante. É causada por um parasita, que consegue penetrar e se multiplicar nas células do sistema imune dos seres humanos e dos cães. No homem, os órgãos mais atingidos são o fígado e o baço.

Para cada cão com sintomas da leishmaniose vísceral vivendo em área em que a doença está registrada, há outros cinco aparentemente saudáveis que já adquiriram a doença e que podem transmiti-la. No Brasil, anualmente são registrados cerca de 3.500 casos de leishmaniose visceral em seres humanos, dos quais 250 evoluem para o óbito, entre eles, 60% são crianças com menos de dez anos. Até o final dos anos 1990, a leishmaniose visceral ocorria em áreas rurais do nordeste do Brasil, posteriormente avançou para áreas urbanas e peri-urbanas alastrando-se pelo país. Hoje, 70% dos de casos de LV em seres humanos ocorrem no nordeste e 30% nas regiões sudeste e centro-oeste do Brasil. No Estado de São Paulo, o primeiro caso de leishmaniose visceral foi confirmado em cão doméstico em Araçatuba, em 1998, e em seguida foi constatado o primeiro caso em ser humano. A ocorrência da doença tem evoluído de forma crescente e progressiva entre os municípios da região noroeste paulista, com tendência a migrar para o centro do Estado, acompanhando o trajeto da Rodovia Marechal Rondon.

Como a leishmaniose visceral é transmitida?

A transmissão da leishmaniose visceral ocorre pela picada dos mosquitos conhecidos popularmente como mosquito palha, birigüi, asa dura ou tatuquira. Esses mosquitos são pequenos, com um a três milímetros de comprimento, recobertos de pêlos, e de coloração clara, cor de palha ou castanho claro. São facilmente reconhecíveis por seu comportamento ao voar em pequenos saltos e pousar com as asas entreabertas e ligeiramente eretas. A atividade dos mosquitos inicia-se ao entardecer até aproximadamente 23 horas, podendo manter-se até o amanhecer. São comuns em galinheiros, chiqueiros, canis e outros locais sombreados. No interior das casas, os mosquitos são encontrados em repouso nas paredes. As fêmeas dos mosquitos depositam os seus ovos na terra, em lugares úmidos, ricos em restos vegetais como folhas, frutos, resíduos de alimentos e fezes de animais e com baixa luminosidade. No solo, após sete a 10 dias, as larvas saem dos ovos e transformam-se em pupas, que dão origem aos adultos. Os mosquitos-palha adquirem o parasita quando sugam o sangue dos cães parasitados e o transmitem quando sugarem outro cão ou humano.

Manifestações clínicas nos cães e nos seres humanos

Os sinais clínicos da leishmaniose visceral canina (LVC) são inespecíficos,tais como febre, anemia e emagrecimento. As lesões na pele são as mais comuns (50 a 90% dos cães com quadro clínico) e podem ser a única alteração clínica. Observam-se áreas com queda de pelos e descamação cutânea branco prateadas mais pronunciada na cabeça, ao redor dos olhos, narinas e borda das orelhas, que com a progressão da doença e a multiplicação do parasita evoluem para feridas por todo o corpo do animal principalmente em zonas ósseas salientes. É freqüente a observação de cães com o quadro de crescimento exagerado das unhas. Podem ser observados aumento dos gânglios linfáticos (ínguas), bem como comprometimento do fígado e do baço.

Os cães com a leishmaniose visceral frequentemente apresentam anemia, falta de apetite, vômitos e diarréia crônica, hemorragias nasais, problemas locomotores decorrentes de feridas nas patas, convulsões, andar em círculos, movimentos oculares involuntários, quadros de estrabismo e paralisia da mandíbula. Ingerem muita água e urinam muito, o que indica comprometimento dos rins, principal causa de óbito. Infecções secundárias e oportunistas concomitantes, tais como piodermites, micoses cutâneas e sarnas, ou co-infecções com outros patogenos graves, o que complicam o quadro clínico.

Em seres humanos, a forma assintomática é comum nas áreas, endêmicas, mas com reações sorológicas positivas; enquanto que nas formas clínicas aparentes observam-se febre baixa recorrente, tosse seca, diarréia, sudorese e prostração. A forma crônica ou clássica da leishmaniose visceral é de evolução prolongada, com desnutrição protéico-calórica, e emagrecimento progressivo, abdome aumentado em função do aumento de tamanho do fígado e do baço , dificuldade respiratória, dor de cabeça, dores musculares, perturbações digestivas, hemorragias nasais e evolução para o óbito se o paciente não for submetido ao tratamento específico.

Como é feito o diagnóstico da leishmaniose visceral canina e humana?

O histórico da região onde o animal ou o individuo habitam leva a suspeição da doença, cuja confirmação diagnóstica deve estar associada à observação clínica e aos exames laboratoriais identificando a presença do parasita ; ou a detecção de anticorpos circulantes no sangue por testes sorológicos. Animais doentes produzem altos títulos de anticorpos, no entanto os cães parasitados, mas que não apresentaram sintomas, podem ter baixos níveis de anticorpos, o que dificulta sobremaneira a confirmação laboratorial do diagnóstico com esta metodologia. Nível de anticorpos elevado irá confirmar a presença da doença, enquanto os valores baixos exigem a realização de procedimentos laboratoriais complementares e também diagnóstico diferencial com outras enfermidades.

O diagnóstico humano e o acompanhamento da doença conta com o serviço do Ambulatório de Zoonoses do Instituto de Infectologia Emílio Ribas, São Paulo-SP; localizado na avenida Dr. Arnaldo, 165, Prédio dos Ambulatórios. As consultas poderão ser agendadas pelo telefone (11) 3896-1200 (PABX) ou pelo site do hospital. Os trabalhos acontecem sob responsabilidade do Dr. Marcos Vinicius da Silva (marcos.silva@emilioribas.sp.gov.br ou mvsilva@pucsp.br).

Existe tratamento para cães? Como é efetuada a prevenção e o controle da leishmaniose visceral ?

Em 11 de julho de 2008, o Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento e o Ministério da Saúde, publicaram uma portaria proibindo em todo o território nacional o tratamento de leishmaniose visceral canina com produtos de uso humano ou não registrados no Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento. Como no Brasil não há produto registrado para tratamento da leishmaniose visceral canina, conclui-se que o tratamento de cães com leishmaniose não é permitido. Tal portaria baseou-se, no fato de que, até o momento, nenhum fármaco ou esquema terapêutico garante a eficácia do tratamento canino, a redução do risco de transmissão para outros cães e humanos; com o agravante de potencial seleção de parasitas resistentes aos medicamentos disponíveis para o tratamento da leishmaniose humana.

Dentre as medidas para o combate a leishmaniose visceral está a realização de inquéritos epidemiológicos para identificação de cães infectados com sua posterior eliminação, campanhas sistemáticas contra os mosquitos transmissores nas áreas em que a doença foi registrada e o tratamento dos casos humanos. A eliminação de cães domésticos apresenta o menor suporte técnico-científico entre as três estratégias do programa de controle. O tempo decorrido entre a coleta do sangue, o diagnóstico e a eutanásia do cão é um dos pontos contestados e que seguramente gera falhas no controle da doença. Outro fator é a elevada taxa de reposição canina após a eutanásia, nos ambientes ainda contaminados

A diminuição da transmissão da doença deve ser baseada fundamentalmente no controle dos mosquitos transmissores que deve ser efetuado com a borrifação do domicílio e peri-domicílio com organoclorados, organofosforados e piretróides, limpeza de quintais e principalmente a educação sanitária da população, pela conscientização da necessidade da limpeza constante de quintais, remoção de fezes de animais e de resíduos orgânicos.

Medidas para proteger individualmente cães incluem a manutenção do animal dentro de casa ou em canis telados no período de maior atividade do mosquito transmissor, e uso de inseticidas tópicos preconizados pelo médico-veterinário. Atualmente há no mercado brasileiro três coleiras contendo inseticidas para proteção de cães contra leishmaniose visceral, que devem ser utilizadas associadas às demais medidas de controle.

Atualmente existe uma única vacina contra LVC no mercado brasileiro; porém o Ministério da Saúde do Brasil ainda não recomenda a sua utilização como medida de controle da doença, uma vez que, até o momento, não existe a comprovação, de forma acurada, da sua capacidade de promover a redução da incidência da infecção em humanos, da prevalência da doença em cães e da transmissão do parasito ao vetor. A vacina anti-leishmaniose LVC deve ser aplicada apenas em cães com diagnóstico sorológico negativo. Ainda, segundo o Ministério da Saúde, mesmo com o atestado de vacinação, um animal sorologicamente positivo deve ser submetido à eutanásia, uma vez que a aplicação da vacina não confere imunidade a todos os cães e que este animal poderia estar infectado.

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