Temporada de chuvas fortes intensifica riscos de desastres e disseminação das zoonoses

Doenças como a leptospirose e desmoronamentos estão diretamente associadas ao impacto gerado por alagamentos e desequilíbrio ambiental. Especialistas propõem reflexão sobre políticas públicas preventivas
Texto: Comunicação CRMV-SP / Foto: Pixabay

Após período de seca e alta temperatura no final do ano passado, o Instituto Nacional de Meteorologia (Inmet) divulgou dados confirmando um acumulado de chuva no Estado de São Paulo que superou a média histórica registrada no período de 1981 a 2010. Segundo a entidade, em apenas cinco dias a quantidade de chuva atingiu praticamente todo o volume que era previsto para o mês. E já foi emitido aviso meteorológico apontando perigo potencial devido a chuvas intensas previstas para os próximos dias.

Com o aumento na incidência de grandes volumes de água e seu respectivo impacto como enchentes, alagamentos e deslizamentos de terra, a presidente da Comissão de Saúde Pública Veterinária do Conselho Regional de Medicina Veterinária do Estado de São Paulo (CRMV-SP), Adriana Lopes Vieira, aponta os aspectos de médio e longo prazo que também comprometem a qualidade de vida das vítimas em contato com água contaminada, lama e lixo.

“Quando se considera a Saúde Única e o Bem-estar Único, a qualidade da água é imprescindível para a vida, a saúde e o bem-estar dos seres humanos e outras espécies animais. A poluição dos recursos hídricos ou sua escassez afetam o equilíbrio dos ecossistemas, além de causarem impactos sociais e econômicos”, ressalta.  

Com especialização em Saúde Pública e em Administração de Serviços de Saúde, a médica-veterinária mestre em Epidemiologia Aplicada às Zoonoses lembra que as doenças de veiculação hídrica podem ser causadas por diversos micro-organismos, como bactérias, fungos, vírus, protozoários e helmintos, presentes em água contaminada.

“A Leptospirose, transmitida por roedores, é um exemplo comum de doença sistêmica aguda que pode acometer o homem e os animais, sendo causada por bactéria do gênero Leptospira. O quadro clínico varia desde infecção assintomática até quadros graves que levam o paciente ao óbito”, afirma Adriana.

Prevenção

A presidente da Comissão de Saúde Pública do CRMV-SP explica que a leptospirose ocorre durante o ano todo, porém sua maior incidência se dá nos meses de verão, devido às chuvas, enchentes e, consequentemente, ao contato humano com urina de roedores contaminada com a bactéria. “Quanto à prevenção, além da vacinação dos animais, são indicadas medidas como obras de saneamento básico, além de melhorias nas habitações humanas e o controle de roedores.”

Nos casos de iminência de contaminação, a médica-veterinária lembra que é importante evitar o contato com água ou lama de enchentes e impedir que crianças nadem ou brinquem nessas águas. “Pessoas que trabalhem na limpeza da lama, entulhos e desentupimento de esgoto devem usar botas e luvas de borracha, ou sacos plásticos duplos amarrados nas mãos e nos pés”, ressalta.

Além do controle de roedores, Adriana ressalta, ainda, que é preciso evitar que os animais domésticos tenham contato com água ou lama provenientes das enchentes, assim como com a urina de roedores e orienta tutores a seguir orientações do profissional médico-veterinário, não apenas quando surgirem os sintomas, mas após o contato com a água e dejetos dos alagamentos.

Vigilância epidemiológica e ambiental

Para a presidente da Comissão de Saúde Ambiental do CRMV-SP, Elma Polegato, existe uma relação entre a degradação das áreas que deveriam ser preservadas e as consequências provocadas pelo desiquilíbrio no ecossistema. “Os assentamentos humanos, desmatamento, queimadas, caça predatória, obras de infraestrutura, poluição dos recursos naturais, dentre outras atividades antrópicas e nem sempre planejadas favorecem o aparecimento de novas doenças e a alteração do comportamento epidemiológico de antigas.”

Quando existe o desiquilíbrio entre hospedeiro, ambiente e agente causador de doenças agravado por fatores naturais como grandes volumes de chuva e temperaturas elevadas, por exemplo, Elma pondera que “são produzidas condições ideais para a disseminação de patógenos como malária, dengue, febre amarela, leishmanioses, febre maculosa, raiva, hantavirose, gripe aviária, H1N1 e leptospirose, todas conhecidas como zoonoses”.

Durante as últimas duas décadas, segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), aproximadamente 75% das doenças consideradas emergentes que acometem os seres humanos são transmitidas dos animais.

Políticas públicas

Elma Polegato diz que é importante lembrar que “entre as características relacionadas com o aparecimento das doenças, a degradação ambiental é citada como condição primordial”, porém, “essa realidade é pouco considerada em estratégias de políticas públicas, em que a terapêutica é a regra, antes da prevenção de doenças”.

Quando o assunto são as situações de risco às quais seres humanos e animais são expostos nos ambientes urbanos, a médica-veterinária é categórica ao informar que se trata de um problema estrutural e comportamental com hábitos enraizados no processo de desenvolvimento econômico.

“Apesar das novas diretrizes que possam garantir o crescimento sustentável da sociedade, o cenário é um reflexo da condução desordenada ou, em alguns casos, de ausência das políticas públicas que poderiam evitar os desastres registrados todos os anos”, conclui a presidente da Comissão de Saúde Ambiental do CRMV-SP.  

Compromisso e responsabilidade social

Em decorrência das fortes chuvas, desde o dia 30/01, a Comissão de Resgate Técnico Animal e Medicina Veterinária de Desastres do CRMV-SP vem fazendo periodicamente o monitoramento junto as defesas civis dos diversos municípios do Estado sobre as atualizações em relação a condição das chuvas.

“Monitoramos o impacto na população, seja ela humana ou animal, eventuais demandas, desdobramentos, fases de resposta às chuvas. Além disso, o CRMV-SP está de sobreaviso e prontidão monitorando, inclusive, a previsão de novo volume grande de chuvas para o final de semana e, principalmente, para esta segunda-feira (07/02)”, pontua o presidente da Comissão, Leonardo Maggio de Castro.  

Sobre o papel dos médicos-veterinários na prevenção e elaboração de projetos ambientais, Elma Polegato reitera que os “profissionais devem assumir o compromisso e responsabilidade, por meio do conhecimento técnico de colaborarem como agente de multiplicação das informações, seja integrando equipes de saúde pública ou em todas as atividades que desempenham nas mais diversas áreas de atuação”.

O médico-veterinário está apto para prestar apoio com responsabilidade socioambiental e sanitária, utilizando práticas sustentáveis, seja no cotidiano profissional ou na orientação à população. “Atitudes simples que poderão esclarecer, na prática, os conceitos de Saúde Única como opção de medicina integrativa, preventiva e garantia de uma vida com mais qualidade para todos”, desta Elma.

Confira dicas do que fazer em casos de enchentes

– Evite o contato direto com a água e a lama;

– Se a casa for inundada pela enchente, espere a água baixar, remova a lama e desinfete o local, sempre usando luvas, botas de borracha ou outro tipo de proteção para braços e pernas, como sacos plásticos duplos;

– Descarte os alimentos e medicamentos que tiveram contato com a água de enchente;

– Não deixe crianças e cães brincarem ou nadarem em locais com água e lama de enchentes ou outros pontos que possam estar contaminados pela urina de roedores;

– Se a caixa d’água foi atingida por lama, descarte a água e faça a desinfecção do reservatório;

– Não pesque em rios e lagoas após as chuvas;

– Pessoas que trabalham na limpeza da lama, retirada de entulhos e desentupimento de esgotos devem sempre usar botas e luvas de borracha ou outro material de proteção.

Como prevenir a leptospirose

– Acondicione o lixo em sacos plásticos ou em recipientes bem fechados, armazenando-o em local alto até que seja coletado;

– Guarde sempre os alimentos em recipientes bem fechados e em locais elevados do solo;

– Mantenha a cozinha limpa, sem restos de alimentos;

– Retire as sobras de alimentos ou ração de animais domésticos antes do anoitecer, mantendo sempre o vasilhame limpo;

– Mantenha quintais, ruas, terrenos e as margens dos córregos limpos e capinados;

– Evite acumular nos quintais e terrenos entulho e objetos como telhas, madeiras e material de construção, para não servirem de abrigo aos roedores;

– Feche buracos e vãos nas paredes e rodapés;

– Mantenha as caixas d’água limpas e tampadas e trate a água de poços antes da utilização.

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