Novembro Negro: saiba como agir em casos de discriminação no exercício profissional

Médica-veterinária vítima de ataques virtuais alerta para a importância do posicionamento e da diversidade no setor
Texto: Comunicação CRMV-SP / Foto: arquivo pessoal Talita Santos

O Dia Mundial da Consciência Negra é celebrado em 20 de novembro em todo o território nacional com abordagens do contexto histórico e atualização dos fatos cotidianos relacionados ao tema. No caso da Medicina Veterinária e na Zootecnia, a data se destaca como momento de reflexão, em especial, diante de lamentáveis casos de racismo e injúria racial ocorridos recentemente virtual e presencialmente em ambiente acadêmico e profissional.

Os casos recentes mais emblemáticos e que tiveram manifestações do Conselho Regional de Medicina Veterinária do Estado de São Paulo (CRMV-SP), regionais de outros estados, assim como diversas associações e entidades, foram os ocorridos em dezembro de 2020, com o médico-veterinário Raffael de Oliveira, em uma clínica de Iguaba (RJ); e com a médica-veterinária Talita Fausto da Motta Santos, de São Paulo (SP), durante uma palestra on-line.

Oliveira recebeu um tutor que recusou o atendimento e não quis assinar o termo de autorização de cirurgia de um animal, usando vocabulário racista. O caso está sob investigação policial pelo crime de injúria racial. Já Talita sofreu ataques racistas enquanto ministrava palestra on-line promovida pelo Grupo de Estudos de Animais Selvagens (Geas) da Universidade Estadual Paulista (Unesp) de Botucatu.

Segundo relato da profissional, que é especializada no atendimento de animais silvestres e exóticos, a live foi invadida e foram colocados sons e imagens de primatas, além de mensagens racistas e misóginas de forma escrita. Aos 33 anos, Talita demonstra maturidade na maneira de enfrentar o racismo, diz que “infelizmente já está calejada” e enfatiza que mudou sua perspectiva sobre situações como a que aconteceu durante sua palestra.  “Na verdade, quem deve se sentir constrangido é o agressor”, afirma.

Após oito anos de formação, a profissional considera que a passos lentos as coisas estão mudando, apesar de muitos ainda acharem que não é preciso falar sobre o tema. “É preciso falar sim sobre as diferenças de classe, de cor e relações humanas que podem impactar na atuação profissional”, pontua.

Denúncia e judicialização

O coordenador jurídico do CRMV-SP, advogado Bruno Fassoni, orienta que as vítimas de racismo ou de injúria racial formalizem denúncia junto a Polícia. “Para o boletim de ocorrência é importante que o profissional reúna provas e testemunhas, e reapresente a queixa, no caso de injúria racial, perante o Ministério Público em até seis meses. Por sua vez, o crime de racismo independe de reapresentação”, esclarece.

Fassoni ressalta que a vítima deve buscar, também, orientação jurídica com um advogado de sua confiança ou, na hipótese de não poder arcar com as custas, na Defensoria Pública local, para dar continuidade ao processo nas esferas cível e criminal.

Talita, que seguiu as orientações, apoia também a manifestação das pessoas quando forem agredidas. A médica-veterinária desabafa dizendo que é comum ouvir “conselhos” sugerindo que não se exponha e que não dê importância às ofensas. “É incrível ainda precisar reivindicar coisas simples como respeito.”

Preconceito

A médica-veterinária Talita Fausto da Motta Santos trouxe à tona sua experiência cotidiana marcada por agressões veladas e explícitas que, segundo ela, sempre ocorreram, “seja em forma de piadas consideradas inocentes ou discriminação agressiva e direta”.

“Muitas pessoas demonstram, nitidamente, um espanto quando se deparam com médicos-veterinários pretos nas clínicas e hospitais. Muitos desprezam a presença do profissional enquanto outros questionam abertamente sobre as condições que proporcionaram a inserção em uma área historicamente ocupada por pessoas brancas e de classe média ou alta. O perfil da Medicina Veterinária reflete a realidade de um País com diferenças sociais”, destaca Talita.

A profissional destaca que a falta de conscientização e representatividade provoca esse abismo e considera essencial que haja demonstrações da presença de pessoas pretas nas faculdades e no mercado de trabalho, influenciando, inclusive, o comportamento dos tutores e clientes envolvidos na rede de atuação do médico-veterinário. “Quando as crianças pretas observam com mais frequência nossa presença em anúncios e divulgação da profissão, entendem que isso é possível para elas também”, finaliza.

Injúria racial ou racismo?

Fassoni explica que racismo e injúria racial possuem enquadramentos diferentes. Enquanto o racismo, definido pela Lei nº 7.716/2012, pode ser caracterizado como o ato de impedir ou negar acesso de uma pessoa a um estabelecimento, espaço, emprego ou direito, usando como alegação etnia e/ou cor, não afetando apenas um indivíduo, mas todas as pessoas que pertencem àquele grupo; a injúria racial, ocorre quando alguém é destratado ou ofendido em decorrência de sua etnia.

O racismo, conforme a Constituição Federal, em seu artigo 5º, é um crime inafiançável e imprescritível. No caso da injúria racial a pena pode ser de reclusão de 1 a seis meses e/ou multa.

Os casos de Talita e Oliveira foram enquadrados como injúria racial, conforme o Código Penal, em seu artigo 140, parágrafo terceiro. O coordenador jurídico do CRMV-SP destaca, entretanto, que a vítima deve estar atenta, pois alguns delegados acabam por registrar as ocorrências como injúria simples, considerada de potencial ofensivo menor e, por isso, com penalidade mais leve, razão pela qual o assessoramento de um advogado ou um defensor público é de suma importância.

Relacionadas

Médico-veterinário negro está sentado atrás de uma mesa com computador, olhando e sorrindo para a câmera.
IMG_7801
08.10.2021_Posse_Comissão_Representantes_Regionais
Punhos fechados de diversos tons de pele estão levantados em frente a um fundo na cor laranja

Mais Lidas

Diagnóstico por imagem é uma das especialidades reconhecidas pelo CFMV
Crédito: Acervo CRMV-SP
Notebook com a tela inicial da Solução Integrada de Gestão do CRMV-SP (SIG CRMV-SP)
Responsável técnico é a figura central que responde ética, legal e tecnicamente pelos atos profissionais da empresa
Crédito: Freepik
Em São Paulo, a primeira instituição destinada ao ensino da Veterinária teve origem no Instituto de Veterinária, nas dependências do Instituto Butantan, no ano de 1919 Crédito da foto: Acervo Histórico/FMVZ-USP

Contato

(11) 5908 4799

Sede CRMV-SP 

Endereço: Rua Apeninos, 1.088 – Paraíso – CEP: 04104-021
Cidade: São Paulo

Newsletter

Todos os direitos reservados ao Conselho Regional de Medicina Veterinária do Estado de São Paulo – CNPJ: 50.052.885/0001-40